Epístola

do Apóstolo Paulo

Aos Romanos.

 

Bispo Alexandre Mileant

Traduzido por Tatiana Zyromski

 

 

Conteúdo:

Informações Preliminares.

A Explicação da Epístola

Introdução A essência da pregação do Evangelho.

Exposição da Fé Cristã.

Todos os Homens São Pecadores E Estão Sujeitos ao Juízo de Deus. A Corrupção Moral dos Gentios. Deus é justo. A decadência dos judeus. Conclusão: todo são culpados. Cristo É a Única Salvação. A necessidade da fé. Abraão é o pai de todos que têm a fé. Absolvição pelo sangue de Cristo. A morte veio de Adão, a vida veio de Cristo. A Força da Graça de Cristo. Da escravidão à uma vida nova. O conflito interno. A vida no Espírito Santo. A alegria de sermos adotados por Deus. A glória vindoura. O amor de Deus é tudo para nós. A Missão de Israel. A providência Divina nos destinos dos povos. O mal do Israel é a sua falta de fé. A conversão vindoura de Israel.

A Essência da Vida Cristã.

O uso dos dons espirituais. A obediência das autoridades seculares. O amor é a coisa principal. A vida em harmonia. Cristo é o exemplo de paciência infinita. Os Votos e as Saudações. Devemos Guardar a Pureza da Fé.

Conclusão:

 

 

Informações Preliminares.

Entre todos os livros sagrados do Novo Testamento a epístola do apóstolo Paulo aos Romanos, tem um lugar de destaque: nenhum dos livros sagrados discute os fundamentos do cristianismo tão profundamente, como esta epístola.

São Paulo reuniu em si muitos talentos, que fizeram desta obra um documento importantíssimo dos ensinamentos cristãos. Esta obra abrange um profundo conhecimento das Escrituras Sagradas do Velho Testamento, uma profunda erudição e um grande talento de escritor. Por isso toda a Epístola do Apóstolo Paulo aos Romanos sempre atraía a atenção tanto dos cristãos simples, como dos filósofos cristãos e na antigüidade era chamada de "Segundo Evangelho." Acho que é por isso tudo, que esta epístola está colocada como primeira, na frente de todas as outras epístolas.

Como podemos perceber do conteúdo desta epístola, o apóstolo Paulo muitas vezes tentava pregar a Fé Cristã na capital do glorioso e poderoso império, mas sempre surgiram vários obstáculos. Naquela época, em Roma já havia uma considerável comunidade cristã. Ela consistia tanto de judeus convertidos, como de romanos. Não sabemos ao certo como surgiu esta comunidade. Sabemos, que ainda antes do Nascimento do Nosso Senhor já havia muitos judeus em Roma e que alguns deles peregrinavam para Jerusalém por ocasião de grandes festas. Ao visitar Jerusalém durante a vida de Jesus, eles não puderam ignorar os grandes milagres Dele, bem como os Seus novos e sublimes ensinamentos. Assim, é muito provável, que as primeiras sementes de cristianismo chegaram à Roma ainda durante a vida de Cristo.

O livro dos Atos relata, que por ocasião de Pentecostes no ano de 33 d.C., muitos peregrinos de diversos países, e entre eles peregrinos de Roma, testemunharam a descida do Espírito Santos aos Apóstolos (Atos 2:10). Cerca de três mil pessoas, influenciadas por este milagre maior e pelo sermão entusiástico do apóstolo Pedro se batizaram naquele dia, e alguns dias mais tarde — ainda cinco mil. Assim a difusão do cristianismo ganhou desde o seu começo proporções gigantescas e a fé cristã começou a enraizar-se também nos países vizinhos - na Síria, na Ásia Menor, no Chipre, na Grécia, no Egito, etc. E isto tudo acontecia não só graças à pregação dos apóstolos, mas também graças aos neófitos em Jerusalém, os quais, voltando para a casa após a sua peregrinação, contaram sobre a nova e maravilhosa fé. Foi assim que o cristianismo chegou até a Antioquia, conforme está relatado no livro dos Atos (Atos 11:26). É muito provável, que foi assim que ele chegou até Roma. Podemos perceber pelas saudações do apóstolo Paulo, contidos no final da epístola, que o apóstolo Paulo conheceu pessoalmente muitos dos cristãos romanos, os quais provavelmente conheceu ainda em Jerusalém, o qual ele mesmo muitas vezes visitava.

No começo do primeiro século, em Roma havia cerca de 50.000 judeus e 11 sinagogas. Originalmente, a comunidade cristã lá consistia quase que exclusivamente de judeus. Mas dentro em breve começou a aumentar graças aos romanos de tal forma, que após algumas décadas o número de romanos cristãos era maior que o número de judeus batizados. No começo, eles todos viviam em harmonia, junto rezavam e comungavam. Mas já em meados do primeiro século começaram a surgir desentendimentos entre eles por causa da nacionalidade. Estes desentendimentos eram fomentados pelos judeus, que invejavam o sucesso da nova fé cristã e instigavam os judeus batizados contra outros, exortando-os a não se misturar com os cristãos que se converteram do paganismo. Eles chamavam estas pessoas de impuras e indignas de dividir a eterna felicidade prometida aos seus patriarcas. Estas artimanhas deram resultado, pois em meados do século I, em Roma, houve muitos conflitos religiosos entre os judeus, de modo que o imperador Cláudio no intuito de acabar com isto, baniu muitos judeus da capital (anos 41-54). Provavelmente, depois disto, os conflitos religiosos acabaram. No entanto, podemos perceber uma grande preocupação com o problema judeo-cristã na epístola do apóstolo Paulo. São Paulo conheceu perfeitamente as Escrituras do Antigo Testamento e baseado nelas, ajuda aos seus leitores perceber nelas as raízes de cristianismo e ao mesmo tempo prova, que para Deus não importa a descendência biológica, mas sim, a fé sincera.

Esta epístola foi escrita na cidade de Corinto, durante a terceira viagem missionária do apóstolo, cerca no ano de 59 d.C. O apóstolo tinha uma esperança, de que após a sua visita a Jerusalém, ele poderia visitar Roma e ajudar no fortalecimento da comunidade cristã. E realmente, são Paulo conseguiu visitar Roma no verão do ano de 62, - mas só após grandes aborrecimentos em Jerusalém conforme descrito no Livro dos Atos (capítulos 21-28). O apóstolo Pedro também visitou Roma, mas, ao que parece, depois do apóstolo Paulo. Alguns anos mais tarde, ambos os apóstolos visitaram de novo Roma (acerca do ano de 67) e ambos morreram lá como mártires, à mando do imperador Nero (anos 54-68).

O assunto principal da epístola aos Romanos é que Nosso Senhor Jesus Cristo é o único Salvador da humanidade pecadora. Nem a voz da consciência, nem o medo do castigo eterno, nem os ensinamentos dos profetas Divinos, nada disso poderá salvar o homem do seu principal mal — o pecado. O pecado trouxe uma dualidade no ser humano. Como Deus criou a nossa alma conforme a Sua imagem, então todo homem aspira a proximidade de Deus; mas o pecado nos escraviza, obrigando-nos a fazer aquilo, que não queremos. A causa da morte de todo e qualquer ser humano, seja um ancião, seja uma criança inocente recém nascida, é a nossa natureza pecaminosa. Na realidade, o paraíso e a vida eterna com Deus é inatingível não só para os gentios, pagãos, mas também para os judeus que vivem de acordo com a lei de Moisés. Mas Deus misericordioso achou o caminho de salvação para a humanidade: Ele mandou para o mundo o Seu Filho Unigênito, Nosso Senhor Jesus Cristo, O Qual com a Sua morte redimiu os pecados dos homens e com a Sua ressurreição abriu para nos o caminho para o Reino de Deus. Agora todo e qualquer homem, seja judeu ou pagão, recebe a remissão de seus pecados e a abençoada ajuda não por causa de seus méritos individuais, mas exclusivamente pela fé em Nosso Senhor Jesus Cristo. O ponto de partida do pecado para uma vida justa é o Batismo. Neste sacramento, o homem que tem fé se purifica do pecado, se livra da escravidão das paixões e recebe forças espirituais. Assim, um pecador culpado se transforma, pela graça, no filho de Deus e no herdeiro do Reino da glória. Esta obra de salvação é tão grandiosa, que todo o resto não significa nada.

A segunda parte da epístola (capítulos 12-15) é dedicada à exposição da essência de uma vida cristã. O apóstolo exorta os fiéis a levar a vida de acordo com os ideais sublimes da fé cristã e os dons espirituais, recebidos, empregar para o bem comum.

O capítulo 4, onde o apóstolo mostra como exemplo a fé de Abraão, e também os capítulos 9 a 11, onde ele analisa o problema espiritual do Israel infiel, estão um pouco fora da atualidade. Mas, mesmo assim, eles são sumamente importantes, porque ajudam a compreender melhor as bases da fé cristã, a qual tem as suas raízes nas Escrituras Sagradas do Velho Testamento.

Na Epístola aos Romanos o leitor achará pensamentos sobre assuntos espirituais, que são de uma profundidade invulgar, e estes assuntos nunca, em nenhuma parte das Escrituras, eram tão detalhadamente discutidos, como nesta Epístola. Por exemplo: sobre o pecado original e sobre a danificação da natureza humana, sobre a força da consciência, sobre o significado da fé para a salvação eterna, sobre as propriedades de regeneração do sacramento de Batismo, sobre a força da graça de Cristo, sobre a regeneração de toda a natureza, sobre o significado de Israel na história da humanidade, e outros mais.

Na epístola do apóstolo Paulo aos Romanos o leitor encontrará alguns lugares que são de difícil interpretação. Esta dificuldade é devida à profundidade do tema, à exposição concisa e à riqueza do vocabulário grego. Foi ainda o apóstolo Pedro que mencionou uma certa "dificuldade de compreensão" nas epístolas do apóstolo Paulo (2 Pedro, 3:16). Não há nenhuma tradução, que possa satisfazer tanto a exatidão literal e a leveza da leitura. Por exemplo, a tradução para o eslavo é literal, porém é de difícil compreensão. A tradução para o russo é muito mais compreensível, mas em algumas partes não é exata.

Para ajudar ao leitor na interpretação desta epístola, aproximamos a tradução à língua moderna. Além do texto grego original e a tradução russa aprovada pelo Santo Sínodo, usamos também algumas traduções inglesas, a obra de Teofano Recluso sobre a epístola (onde há os ensinamentos de vários santos padres da Igreja), uma "Bíblia" do professor P. Lopukhin e seus colaboradores, e também algumas pesquisas atuais sobre esta epístola.

 

 

A Explicação da Epístola.

 

Introdução.

(Romanos 1:1-17)

 

Saudação, 1:1-15. O apóstolo Paulo escreveu a sua saudação de acordo com a forma estabelecida naquela época, conforme a qual ele devia, numa forma concisa, falar sobre si e sobre a essência da sua missiva:

 

Paulo, servo de Jesus Cristo, apóstolo por vocação divina, escolhido para pregar o Evangelho de Deus, que Ele, por seus profetas, prometera nas Sagradas Escrituras, a saber: o Evangelho de Seu Filho, Jesus Cristo, nosso Senhor. Nascido pela carne da descendência de Davi, porém, pelo Espírito Santo, ressuscitando dos mortos, Ele demonstrou a Sua grande força de Filho de Deus. Foi por intermédio Dele que nós recebemos a graça e o múnus do apostolado, a fim de sujeitar à fé todos os povos, para glória de Seu nome. Entre eles estão também vós, chamados por Jesus Cristo. A todos vós de Roma, a quem Deus chamou em Seu amor para a santidade, graça e paz da parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo (1:1-7).

 

Para acalmar os judeus acerca dos ensinamentos do cristianismo, o apóstolo explica, que ele não prega nenhum ensinamento novo, mas tão só explica mais amplamente aquilo, já escrito por profetas antigos.

 

Antes de tudo, dou graças a meu Deus, mediante Jesus Cristo, por todos vós, pois, vossa fé é elogiada no mundo inteiro. Porque, Deus — a quem preste um culto espiritual, pregando o Evangelho de Seu Filho — me é testemunha de como penso em vós incessantemente, suplicando-Lhe sempre, em minhas orações, seja-me dada ocasião favorável de ir ter convosco, se fôr da vontade de Deus. Muito anseio, deverás, ir ver-vós, para vós comunicar algum dom espiritual que vos conforte, ou melhor, para, em vosso meio confirmarmo-nos uns aos outros na profissão da mesma fé, vossa e minha. Não quero que ignoreis, irmãos: muitas vezes tive a intenção de visitar-vos, não me sendo possível realizá-lo até agora, para colher algum fruto entre vós, como o colhi entre outras nações. Na verdade, sinto-me obrigado a pregar aos gregos como aos bárbaros, aos sábios como aos ignorantes. Assim, não me falta vontade em anunciar o Evangelho também a vós, habitantes de Roma (1:8-15).

 

Uma vez que a Roma era o centro do poder legislativo e administrativo, ao qual se dirigiam todos os pontos administrativos daquele enorme e poderoso império, então a fundação de uma comunidade cristã lá era super importante para o êxito de cristianismo. Foi por isso que o apóstolo Paulo desejava tão ardentemente fortalecer a fé cristã em Roma. Mas como ele não teve a possibilidade de vir para lá logo, o apóstolo deseja fortalecer os cristãos de lá pelo menos através de uma epístola.

 

A essência da pregação do Evangelho.

(1:16-17)

 

Pois, não me envergonho do Evangelho, que é um poder divino para a salvação dos que crêem, primeiro dos judeus, depois dos gentios. Porquanto, nele se manifesta a justiça de Deus, pela fé e para a fé, como está escrito: "O justo viverá da (sua) fé" (Habacuc 2:4, Romanos 1:16-17).

 

Apesar de que a Roma era famosa por seu poderio, seu poder militar e suas riquezas, o apóstolo Paulo não tinha vergonha da sua modesta pregação sobre Jesus crucificado. Todos os bens materiais do mundo gentio, são ilusórios e insignificantes: não existe nenhuma força material capaz de tirar o homem do pecado e da condenação à morte. Somente o Evangelho dá aos homens a invencível força Divina, na qual o homem ressuscita moralmente e pela qual ascende à vida eterna no Reino de Deus.

Mais adiante, o apóstolo passa a expor os ensinamentos do Evangelho na seguinte seqüência: a) Todos os homens são pecadores, e por isso são sujeitos à julgamento de Deus e à condenação à morte (1:18–3:30). b) A salvação só é possível pela fé em Cristo (3:21–5:21). c) A fé nos proporciona a abençoada ajuda e uma vida justa (6:1–8:39). Após uma inserção bastante ampla, onde o apóstolo discute o problema de falta da fé em Israel (9:1–11:36), ele termina a sua epístola com a exposição da essência de uma vida cristã (capítulos 12-16).

 

 

Exposição da Fé Cristã.

O leitor das Escrituras Sagradas deve se acostumar à forma bíblica da narração. O homem moderno está acostumado com o assim chamado "método científico", onde os temas estão expostos numa certa sucessão lógica. Quando termina um tema, aí começa o segundo, resultante do primeiro. Na literatura científica o pensamento deve fluir numa linha reta. Tal método é seco, sem vida e não presta para a exposição de temas profundamente religioso-psicológicos, onde cada assunto é ligado à muitos outros assuntos e onde não há necessidade de uma prova científica, que alias é inatingível, mas onde é importante a percepção espiritual. Aqui a classificação rigorosa é impossível e desnecessária. Muitas vezes na Bíblia, e principalmente nas missivas do apóstolo Paulo vários temas, ligados entre si, são discutidos ao mesmo tempo. O autor explica de pontos diferentes a interdependência entre diversos assuntos espirituais, passando de um nível para outro. Ele não caminha por uma trilha já pronta, mas como que conduz o leitor para cima por uma escada em espiral.

O apóstolo, antes de oferecer ao leitor um remédio espiritual, faz o diagnóstico de sua doença moral — aquela que é comum para todos.

 

 

Todos os Homens São Pecadores

E Estão Sujeitos ao Juízo de Deus.

(1:18–3:20)

O pecado não é um simples tropeço da livre vontade, ou um erro, ou uma fraqueza momentânea: ele é uma das mais horríveis doenças, que envenenou toda nossa natureza humana. Todo o mal no mundo inteiro provem do pecado: a perda da liberdade moral, a perda da alegria de contato com Deus. Do pecado resultam inúmeras doenças físicas e psíquicas, a propensão ao mal e a pouca vontade de fazer o bem. O pecado perturbou a harmonia entre as forças físicas e psíquicas, morais, e isso resultou na perturbação da vida familiar e social, resultou na injustiça, na opressão mútua, no embuste, nos crimes, a violência, nas guerras, com as quais vieram a pobreza e a fome ... E é exatamente o pecado que é a causa da pior calamidade — a morte, que inevitavelmente destrui todas as boas e radiantes esperanças do homem!

O apóstolo Paulo começa a sua Epístola pela descrição da depravação do homem. Ele prova, que todos são pecadores, sem exceção. Nada podia redimir espiritualmente o homem: nem a voz da consciência, nem a perfeita criação da natureza, que testemunha sobre o Criador, nem a lei escrita, dada à Moisés por Deus, nada, absolutamente nada podia regenerar a humanidade. Todos — tanto gentios como judeus — afundaram nos pecados e portanto são estranhos à Deus e condenados a perecer.

 

 

A Corrupção Moral dos Gentios.

(1:18-32)

O apóstolo explica, que em princípio todo homem, mesmo sem um ensinamento específico de catecismo, sabe instintivamente , que Deus existe, que existe um mundo espiritual, que alguns atos são corretos e outros não. Esta religiosidade inata acontece porque Deus escreveu a Sua lei na alma de todo homem, e esta lei se faz ouvir através da voz de consciência. Conforme o plano do Criador, todos os homens deveriam se dirigir para o bem. No entanto, na prática aconteceu, que a maioria dos homens peca, ignorando a voz da consciência. Os homens viraram as costas para o seu Criador e se perderam em diversas crenças, caçando os mais baixos prazeres. Portanto:

Realmente, a ira de Deus revela-se do alto do céu contra qualquer impiedade e injustiça dos homens, os quais renegam a verdade pela maldade. Pois, o que se pode conhecer de Deus, a eles foi manifestado, porque Deus, com efeito, manifestou-se a eles. Desde a criação do mundo, a Sua natureza invisível - Seu poder sempiterno e Sua divindade — se fazem visíveis através da contemplação de Sua obra. Por isso, não há escusas para eles. Pois, tendo conhecido a Deus, não O glorificaram como Deus, nem Lhe renderam graças, mas, enredaram-se em seus vãos raciocínios, e se lhes obscureceu o coração insensato (vangloriaram-se de sua sabedoria e tornaram-se estultos, e substituíram a glória de Deus imortal por um simulacro, simples imagem de homens mortais, de aves, quadrúpedes e répteis), e por isso, Deus os entregou à impureza dos apetites de seus corações, de modo a desonrarem seus próprios corpos. Eles confundiram o verdadeiro Deus com seres falsos, prestando culto e adoração às criaturas, em lugar do Criador, o qual é bendito para sempre, amém! (1:18-25)

Por isso, Deus também os entregou a paixões infames: suas mulheres converteram as relações naturais em relações antinaturais. Do mesmo modo, também os homens, abandonando o uso natural da mulher, arderam de volúpia uns para com os outros: homens cometendo torpezas com homens, terminando por experimentar em si mesmos a devida paga de seu desvario. Como não fizeram caso do verdadeiro conhecimento de Deus, entregou-os Deus a sentimentos depravados - por isso, estão repletos de toda espécie de injustiça, malícia, cobiça e perversidade; cheios de inveja, homicídio, discórdia, dolo e malignidade; são detratores, caluniadores, inimigos de Deus, insolentes, soberbos, presunçosos, inventores de iniqüidades, rebeldes aos pais, insensatos e inconstantes, sem amor nem compaixão (1:26-31)

Apesar de conhecerem o veredicto de Deus, que considera dignos de morte os que praticam tais coisas, eles não somente as fazem como aplaudem os que as cometem. (1:32)

 

Em princípio, todos os homens são capazes de reconhecer o Criador e crer corretamente Nele. Ao contemplar a maravilhosa organização da natureza, a sua grandeza, a sua harmonia e a sua beleza, eles podem perceber a onipotência, a sabedoria e a generosidade do seu Criador. Pois, até no cotidiano os homens julgam o mestre conforme a qualidade de suas obras. No entanto, os gentios, ao invés de se empenhar em conhecer Deus e agradecer-Lhe, se entregaram a coisas fúteis. Visando somente coisas materiais e prazeres carnais, eles chegaram a tal insensatez, que no lugar do Criador começaram a deificar as forças da natureza e diversos monstros; e por causa desta sua loucura, eles afundaram ainda mais na depravação.

O apóstolo indica o pecado do homossexualismo como o cúmulo da depravação dos gentios. O apóstolo explica, que este pecado é particularmente repugnante, porque é anti-natural e,é o resultado da máxima depravação carnal. Profanando os seus próprios corpos, os homossexuais colhem o castigo por sua depravação: remorsos, inquietude interna e exacerbação. Esta condenação do homossexualismo por parte do apóstolo é muito importante hoje em dia, quando alguns tentam justificá-lo e legalizar, e a mídia está acostumando a juventude com ele, mostrando-o como algo completamente normal. É muito mal, quando o homem peca, mas é pior ainda, quando ele está tentando justificar o pecado: daí "a ira de Deus desce do céu sobre toda a depravação e inverdade dos homens, que estão reprimindo a verdade com a inverdade."

Uma vez que, conforme o raciocínio do apóstolo Paulo, o modo de pensar incorreto leva as pessoas ao pecado, então, o conhecimento de Deus e bons pensamentos deverão contribuir para a sua cura moral. Eis por que é tão necessário se preocupar com a auto-didática espiritual, pois com isso a luz interna começará a iluminar toda a nossa vida e tudo em volta de nós.

 

 

Deus é justo.

(2:1-16)

Após demonstrar a corrupção da sociedade pagã, o apóstolo se apressa a prevenir os judeus da tentação de censura. Ele prova, que o grau da culpa perante Deus de uma pessoa é medido não só pelos seus atos, mas também por vantagens dadas à cada pessoa. De um modo geral, os judeus conheceram melhor os mandamentos Divinos, eles eram mais morais do que os pagãos e isto lhes dava motivo para desprezar outros povos. O apóstolo está lembrando aos judeus, que as exigências para com eles serão maiores, pois Deus os aproximou a Si; Ele lhes deu a Sua lei Divina, o templo, as missas e as festas religiosas, lhes mandava profetas e fazia tudo para o aperfeiçoamento espiritual deles. Os pagãos, os gentios, ao contrário, eram deixados a si mesmos. Eles não tinham nenhum motivo exterior para viver uma vida justa. E mesmo assim, alguns gentios eram mais morais do que muitos judeus. Como eles não tinham nenhuma lei externa, eles se guiavam pela lei interna — a voz da consciência.

 

Por isso, é inescusável, ó homem, quem quer que sejas, quando te arvoras em juiz. Julgando a outros, condenas a ti, já que fazes aquilo mesmo que condenas. Pois sabemos que o juízo de Deus, cuja norma é a verdade, fere os que cometem tais coisas. Condenando os que praticam tais coisas, quando procedes da mesma forma, pensas, ó homem, que escaparás do juízo de Deus ? Ou desprezas a riqueza de Sua bondade, paciência e longanimidade, desconhecendo que a bondade Divina te incita para a penitência ? Com essa dureza e esse coração impenitente acumulas cólera para o dia da ira e revelação da sentença de Deus, o qual retribuirá a cada conforme suas obras: vida eterna aos que buscam, perseverando na prática do bem, a glória, a honra e a imortalidade; ira e indignação, porém, aos que se obstinam no egoísmo, contradizendo a verdade e regulando sua conduta pela injustiça (2:1-8.).

Tribulação e aflição surpreendem a alma do homem pecador, primeiro o judeu e depois o gentio; enquanto glória, honra e paz será a partilha de quem praticar o bem, primeiro do judeu e também do gentio; pois perante Deus não há acepção de pessoas. Os que pecaram sem conhecer a Lei, também perecerão sem ela. Os que pecaram conhecendo a Lei, serão condenados por essa Lei. Porque, diante de Deus passará por justo, não quem sabe a Lei, mas quem a cumpre (2:9-13).

Em verdade, quando os gentios, sem ter a Lei, guiando-se pela natureza, cumpriram os preceitos da Lei, então, eles, sem a terem, se sujeitam à sua própria lei. Assim, comprovaram que os preceitos dela estão inscritos em seus corações, dando-lhes testemunho a sua consciência e os julgamentos interiores que ora os acusam e ora os escusam. Isto se patenteará no dia em que Deus julgar, por Jesus Cristo, segundo meu evangelho, os desígnios secretos dos homens (2:14-16).

 

Ao criar o homem Deus escreveu no seu coração a lei moral, a qual, através da voz de consciência indica ao homem o bem e o mal. Se o homem tivesse permanecido na sua condição original de inocência, esta interna lei lhe bastaria para levar uma vida justa. Porém por causa do pecado, a nossa consciência obscureceu, e daí houve a necessidade, além da lei da própria consciência, de dar ao homem ainda uma lei escrita, para que ela o guiasse de uma forma mais concreta. Por esta razão Deus deu aos homens os Mandamentos, registrados nas Escrituras Sagradas. De um modo geral, estes Mandamentos ensinam ao homem as mesmas coisas que lhe ensina a própria consciência. No entanto, como estes Mandamentos são uma revelação concreta da vontade de Deus, então a infração deles é uma inescusável transgressão da vontade de Criador. Por isso, os judeus que transgrediram conscientemente a vontade de Deus receberão castigos maiores do que aqueles, que pecam por não conhecerem as leis.

Por outro lado, uma vez que os Mandamentos Divinos exigiram uma maior perfeição moral e portanto, maiores esforços, os judeus, que alcançaram uma vida justa, mereciam maiores recompensas em comparação com os gentios, que viviam de acordo com as suas inclinações inatas primitivas, que não exigiam tanto esforço.

Tanto as recompensas, como os castigos são internos e externos. Quando o homem faz o bem, cumprindo o seu dever moral, ele sente uma satisfação interna, uma paz toda especial e uma alegria. Isto é a sua recompensa interna e um pressentimento da vida bem-aventurada, que ele receberá no Reino dos Céus. Da mesma forma, o homem recebe o castigo pelo pecado cometido, primeiro na forma interna — como remorsos, pesadelos, tristeza, que acompanham qualquer transgressão de leis nos dadas por Deus. E da mesma forma, a transgressão das leis escritas é um pecado maior do que a transgressão das leis da consciência. Por isso, ela nos traz maiores sofrimentos internos. Mas o pecador receberá o pleno castigo por seus crimes depois do Juízo Final. Se nesta nossa vida a justiça é muitas vezes transgredida, na vida eterna ela vencerá plenamente, e cada um receberá a recompensa de acordo com os seus atos. O apóstolo repete esta idéia várias vezes, dizendo: "Deus é imparcial."

No segundo capítulo desta epístola há idéias muito valiosas acerca da salvação. Algumas pessoas acham, que serão salvos somente aqueles que pertencem à fé delas, e todos os outros, como tresmalhados, perecerão. Por exemplo, os católicos acham, que somente os católicos serão salvos, os batistas — só os batistas, etc. Para compreender esta questão, precisamos primeiro nos dar conta de que a salvação, como libertação da condenação, é diferente dos graus de bem-aventurança no Reino dos Céus. A fé correta e os santos dons, nos oferecidos na Santa Igreja, nos ajudam a conseguir uma maior perfeição espiritual e portanto uma maior proximidade à Deus e, portanto, uma maior felicidade. No que se refere à salvação no sentido de perdão e libertação das tormentas no inferno, podemos deduzir do ensinamento do apóstolo Paulo, aqui exposto, que até os gentios, que não tinham nenhuma idéia da existência de Deus, mas que viveram de acordo com a sua consciência, poderão salvar-se. "Em verdade, quando os gentios, sem Ter a Lei, guiando-se pela natureza, cumpriram os preceitos da Lei, então eles, sem a terem, se sujeitam à própria lei. Assim, comprovam que os preceitos dela estão inscritos em seus corações , dando-lhes testemunho a sua consciência e os julgamentos interiores que ora os acusam, ora os escusam" (2:14-15).

Quando o homem age corretamente, a voz de sua consciência e os seus pensamentos aprovam os seus atos. Porém, quando o homem age incorretamente, a sua consciência o acusa. E por mais que o homem queira se justificar por circunstâncias, pela lógica do ato, ou pela sua fraqueza, ele não consegue calar a voz da sua consciência. Infelizmente, com a repetição dos pecados, a voz da consciência fica cada vez mais fraca, e por fim se cala. Por isso, as vezes até parece, que os criminosos não têm nenhuma consciência. Mas, na verdade, ela existe, só que amortecida. Porém no Juízo Final, quando Deus mostrará o estado interno de cada homem, a consciência de cada um se levantará com uma nova força e o acusará e o continuará acusando pela eternidade. Aparentemente, o apóstolo Paulo estava se referindo à este aparecimento da consciência, quando disse: "Isto se patenteará no dia em que Deus julgar ... os desígnios secretos dos homens" (2:16).

 

A decadência dos judeus.

(2:17-3:8)

O apóstolo Paulo, em suas epístolas, divide os homens em judeus e helenos; nos helenos ele subentende todos os não judeus. Esta divisão em duas categorias resultava da posição especial dos judeus entre os outros povos na época do Velho Testamento. Da mesma forma como pessoas diferem umas de outras por suas distintas qualidades e por seus talentos, os povos diferem uns dos outros por suas particularidades nacionais: uns, por exemplo, são muito disciplinados e beligerantes, outros — são bondosos e hospitaleiros, terceiros — são musicais e românticos, quartos — são filósofos e matemáticos, etc. Alguns povos fundaram grandes nações e impérios, determinando os destinos de povos vizinhos, porém outros passaram pela história do mundo de uma forma pouco perceptível e desapareceram para sempre.

O povo judeu sempre se destacou por sua religiosidade. Provavelmente, por causa de sua inata sensibilidade espiritual, o Senhor destacou o povo hebreu e o predeterminou para ser instrumento de salvação de outros povos. Quando os povos vizinhos pagãos, citados na Gênese e outros livros históricos da Bíblia se entregavam às superstições e diversas perversidades, os hebreus honravam o único verdadeiro Deus, Criador do céu e da terra. Os grandes homens justos, tais como Abraão, o profeta Moisés, o rei Davi, os profetas Elias, Isaías e Daniel eram judeus. Foram estes justos do Velho Testamento que prepararam o terreno para a vinda do Messias, Jesus Cristo. Também a Santíssima Mãe de Deus, a Sempre Virgem Maria, o profeta João Batista, os apóstolos, os primeiros missionários do Evangelho, os primeiros mártires e os primeiros santos nasceram do seio do povo hebreu. Não resta dúvida, que Deus incumbiu o povo hebreu com a missão da ressurreição espiritual da humanidade.

Mas, logicamente, cada homem é um indivíduo especial, as vezes muito complicado. Todo homem tem a liberdade de usar seus talentos para o bem ou para o mal, desenvolver os seus talentos ou os "enterrar." Na mesma família uma criança pode ser um gênio cientista e o seu irmão — um vagabundo que não vale nada. Assim, também entre o povo judeu havia grandes justos bem como hipócritas, criminosos e até ateus. Mas, apesar de tudo isso, durante toda a existência do povo judeu, os seus profetas o lembravam constantemente da sua sublime missão espiritual e o exortavam viver de uma maneira correta. No entanto, muitos judeus achavam que esta missão os destaca incondicionalmente, e por isso ignoravam as suas obrigações morais e sua responsabilidade perante Deus. Daí nasceu a sua idéia de supremacia e o seu desprezo pelos outros povos, considerados "impuros." O apóstolo Paulo muitas vezes lembra (tanto nesta epístola, como em outras), que quando não há fé, e uma vida justa, as vantagens externas não só não asseguram uma recompensa de Deus, mas provocam a Sua justa ira. O apóstolo diz:

 

Tu, que te ufanas em ser judeu, confias na Lei e te glorificas em Deus, conhecendo Sua vontade e, instruído pela Lei, sabes distinguir entre o que é melhor; tu, que presumes ser guia de cegos e luz dos que vivem nas trevas, doutor dos ignorantes, mestre de menores, por teres na Lei a norma da ciência e da verdade, tu, pois, que ensinas a outrem, por que não ensinas a ti mesmo ? Pregas que não se deve furtar, e furtas! Dizes que não se deve cometer adultério e cometes adultério! Tu, que abominas os ídolos e despojas sacrilegamente o Templo! Tu, que te glorificas da Lei e ofendes a Deus, transgredindo a Lei! Está bem escrito na Escritura: "Por vossa causa o nome de Deus é blasfemado entre os pagãos" (Romanos 2:17-24; Ezequiel 36:20; Isaías 52:5).

 

Somente um homem judeu, que compreendia plenamente os pontos de vista e os costumes do seu povo, podia acusá-lo de uma maneira tão severa. De uma maneira geral, naquela época, os judeus eram mais morais do que os outros povos. Eles não eram sexualmente tão depravados, como os pagãos romanos. Porém eles encaravam com condescendência tais defeitos como avareza, cobiça, presunção, hipocrisia e orgulho, justificando-se dizendo, que eles cumpriam todos os rituais prescritos pela Lei. Nosso Senhor Jesus Cristo, no Seu discurso registrado pelo apóstolo são Mateus no capítulo 23 do Evangelho dele, condenou severamente a presunção dos lideres do povo judeu. Para um homem ser reconhecido como judeu, ele precisava ser circunciso. O apóstolo diz:

 

Sem dúvida, a circuncisão é de proveito, se guardas a Lei. Se a transgrides, a tua circuncisão se transforma em incircuncisão! Se o incircunciso observa os preceitos da Lei, não será, acaso, tido como circunciso ? Com efeito, quem é por natureza incircunciso, cumprindo a Lei, condenar-te-á a ti, não obstante possuíres a Lei, porque a transgrides! Pois não é judeu quem o é só no exterior, nem é circuncisão a circuncisão exterior da carne; mas é judeu que o é no interior e é só circuncisão a do coração, segundo o espírito, não segundo a letra. Embora ela não tenha o elogio dos homens, tem-no de Deus (2:25-29).

 

O ritual da circuncisão dos meninos era comum entre vários povos da antigüidade. Sabemos, que isto era praticado entre os egípcios e alguns povos semitas ( por árabes até a época do Maomé, e também por outros povos), bem como por algumas tribos africanas. A necessidade de circuncisão foi explicada por alguns como a exigência para uma melhor higiene, por outros — como maior fertilidade ou simplesmente como uma tradição. Entre o povo judeu, o seu começo se deu com o Abraão (2000 anos a. C., Gênesis, 17:9-27). Do ponto de vista da formalidade, a circuncisão servia como um sinal de união entre Deus e o povo judeu. Mas os profetas o explicaram não só como a prática material, mas como "a circuncisão do coração," a repressão dos desejos pecaminosos no coração (Ezequiel 44:7). Uma vez que o sacramento de Batismo substituiu a circuncisão, os apóstolos no seu concílio de Jerusalém declararam que para os cristãos a circuncisão não é obrigatória (Atos 15:28-29; Galatas 5:6 e 6:15; Colossenses 2:11). Mas mesmo assim, os cristãos, descendentes dos judeus, continuavam circuncidar os meninos recém nascidos para manter a tradição. O apóstolo Paulo os lembra, que este ritual não significa nada, se aquilo, que ele simboliza, é violado.

Mais adiante, o apóstolo explica, que ao condenar as faltas dos judeus, ele não quer humilhar a própria religião mandada a eles por Deus. As Escrituras Sagradas ensinavam aos hebreus de como crer corretamente e viver uma vida piedosa, e isto lhes dava a vantagem sobre outros povos, que permaneciam na penumbra espiritual. Porém, a maioria dos hebreus não soube aproveitar esta predileção.

 

Que privilégio tem, pois, o judeu, ou para que lhe serve a circuncisão ? Para muita coisa, sob todos os aspectos. Em primeiro lugar, porque os oráculos Divinos lhe foram confiados. Mas, então, se alguns deles não creram, acaso esta incredulidade destruirá a fidelidade de Deus ? De modo algum! Evidenciar-se-á, pelo contrário, que somente Deus é fiel e que todo homem é desleal, segundo está escrito: "Assim, serás reconhecido justo nas Tuas palavras e triunfarás quando julgares" (Salmo 50:6). Se nossa justiça realça a justiça Divina, que diremos ? Que Deus é injusto ao desafogar Sua ira ? Falo à maneira humana. Nunca! Do contrário, como poderia Deus julgar o mundo ? Se a fidelidade de Deus realça mais Sua glória, à luz de minha infidelidade, por que serei também considerado como pecador ? Então, como alguns caluniosamente nos acusam de dizer, deveríamos fazer o mal para dele provir o bem ? Esses merecem ser condenados (3:1-8).

 

Basicamente, o texto supra afirma, que Deus não renega as Suas promessas. Apesar de que os hebreus transgrediram a sua aliança com Deus, e não justificaram a sua missão, Deus, na Sua infinita sabedoria achou outros meios, como salvar a humanidade. Mas, todos os bons resultados que vêm como resultado da intervenção Divina, não isentam os pecadores da sua culpa por sua teimosia e má vontade. O bem veio a despeito deles, e não graças a eles.

 

Conclusão: todo são culpados.

(3:9-20)

 

Castigando a presunção dos judeus, o apóstolo escreve:

 

Levamos, acaso, alguma vantagem ? De modo algum! Pois, já demonstramos, que judeus e gentios, sem exceção, se acham sob o domínio do pecado, como diz a Escritura: "Ninguém, nem sequer um, é justo. Não há, quem seja sensato e procure a Deus com seriedade. Todos se extraviaram e se perderam; não há alguém que faça o bem, nenhum sequer" (Salmo 13:1-3). "Sua garganta é sepulcro aberto; com suas línguas urdem fraudes. Seus lábios ocultam veneno de serpente" (Salmos 5:10; 139:4). "Sua boca está repleta de maldição e amargura" (Salmo 9:28). "Ágeis são seus pés para derramar sangue; ruína e miséria são seus caminhos; ignoram o caminho da paz" (Provérbios 1:16; Isaías 59:7-8). "Não há ante seus olhos o temor de Deus" (Salmo 35:2). Ora, sabemos que tudo, quanto diz a Lei, diz aos que estão sujeitos à Lei, para que se cale toda a boca e que todo mundo se confesse culpado diante de Deus. Porquanto, pela observância da Lei, nenhum homem será justificado diante d’Ele: pela Lei, só vem o conhecimento do pecado (Romanos, 3:9-20).

 

Os judeus achavam, que esta censura se referia à gentios, pagãos e não a eles. Eles se achavam justos, porque descendiam do Abraão, e cumpriam todos os ritos da Lei. O apóstolo prova a eles, que eles são os pecadores, pois os profetas se referiam a eles, denunciando os seus pecados, e não os dos gentios. Os mandamentos Divinos são maravilhosos, quando o homem se guia por eles. Porém quando ele os transgride conscientemente, isto só aumento a sua responsabilidade.

 

 

Cristo É a Única Salvação.

(3:21-21)

Após demonstrar que todos os homens são pecadores, e que nem o fato de pertencer ao povo hebreu, nem os conhecimento das leis, nem o cumprimento dos ritos podem justificar o pecador perante Deus, o apóstolo Paulo passa ao tema principal da sua epístola, a saber: o homem só poderá ser salvo por Nosso Senhor Jesus Cristo.

 

A necessidade da fé.

(3:21–31)

Ao expor o ensinamento cristão sobre a salvação dos homens, o apóstolo Paulo usa os conceitos e a terminologia que eram costumeiros para os seus contemporâneos. Naqueles tempos, tantos os judeus como os romanos, conheciam noções jurídicas bem definidas. Tais palavras, como a lei, a justiça, a culpa, o resgate, a justificação e outras parecidas, eram compreensíveis por todos. Do ponto de vista jurídico formal, todos os homens que violaram a lei de Deus eram culpados e sujeitos a castigo. Os pagãos violavam a lei moral inata, e os judeus — a lei escrita por Deus.

Mas como se justificar perante Deus, quando nem o parentesco com Abraão, nem a circuncisão e nem o cumprimento das leis ajudam ? O apóstolo explica, que Deus misericordioso, ao ver a impotência dos homens, teve piedade deles e lhes deu a salvação de um modo mais inesperado e mais maravilhoso — a salvação em Jesus Cristo. O apóstolo dedica a maior parte da sua epístola à explicação desta tese principal. A salvação, que Nosso Senhor ofereceu aos homens, o apóstolo chama de verdade, ou justificação, de acordo com os conceitos daqueles tempos. O apóstolo diz:

 

Mas agora, sem a Lei, manifestou-se a justiça de Deus, testemunhada pela Lei e pelos profetas, justiça de Deus pela fé em Jesus Cristo, a todos aqueles que crêem ; pois, já não há mais distinção: todos pecaram e estão sem a glória de Deus; e estão justificados gratuitamente pela Sua graça, em virtude da redenção realizada em Jesus Cristo: Deus o destinou para ser, pelo seu sangue, vítima de propiciação, mediante a fé, para demonstrar Sua justiça, porque, em Sua longanimidade Ele tolerara os pecados anteriores. Para manifestar, enfim, Sua justiça no tempo presente, como quis mostrar-se justo e justificar que vive da fé em Jesus Cristo. (3:21-26).

Há, portanto, motivo de se ufanar ? Nenhum. Em virtude de que Lei ? Pela das obras ? Não! Mas em virtude da lei da fé! Por isso, concluímos que o homem é justificado pela fé, sem as obras da Lei. Acaso, Deus é só dos judeus ? Não o é também dos gentios ? Sim, também dos gentios. Realmente, não há senão um só Deus que justificará, pela fé, os circuncisos e pela mesma fé os incircuncisos. Minamos, pois, a autoridade da Lei pela fé ? Não! Antes, a confirmamos! (3:27-31).

 

Por outras palavras, a justiça exigia, que Deus, como um Juiz imparcial, castigasse todos os pecadores. Mas Deus, vendo a impotência moral dos homens, durante todo o período pré-cristã refreava a Sua ira justa, preparando os homens para a salvação pelo Seu Filho Unigênito. Os profetas da era pré-cristã, com as suas profecias, preparavam o povo judeu para a vinda do Messias, colocando o fundamento da fé n’Ele. E como a humanidade era impotente para redimir a sua culpa perante Deus, então o Filho de Deus tomou sobre Si voluntariamente toda a culpa da humanidade pecadora e Se ofereceu como sacrifício, declinando dos homens o justo castigo que lhes era devido. Este mistério de justiça Divina e de Sua infinita misericórdia, que é incompreensível para os homens, o apóstolo expõe em termos jurídicos um tanto formais. Devemos nos dar conta, que o mistério deste Sacrifício é incompreensível até para os anjos (1 Pedro 1:12; Apocalipse 5:5). Por isso, nenhuma terminologia pode suficiente esclarecê-lo. Este mistério pode ser conhecido mais pelo coração, que pela razão.

Uma vez, que a redenção foi feita pelo Nosso Senhor Jesus Cristo abrangente e totalmente, Deus não exige dos pecadores nenhuma outra formalidade para a justificação. A única condição é a fé em Cristo como Redentor, enviado por Deus. A fé — esta é a mínima e ao mesmo tempo a absolutamente necessária condição para a justificação de todos os pecados.

Era em vão que os judeus se gabavam com suas qualidades exteriores e seu cumprimento dos rituais. Na verdade, eles eram transgressores conscientes dos mandamentos de Deus e portanto têm mais necessidade em misericórdia Divina, que os gentios, que eles desprezavam. E como toda a humanidade, sem exceção alguma é culpada, então após o sacrifício do Nosso Senhor Jesus Cristo, Deus salva todos os pecadores através de uma coisa só — a fé. O apóstolo explica, que a fé não anula o lado religioso-moral das Escrituras Sagradas. A Lei de Deus permanece, porque ela ensina como levar uma vida justa, mas ela é fria e formal. Ela conduz, mas não fortalece o homem. No entanto, a fé aquece e dá-nos a força.

 

Nota 1. A palavra redenção, usada nas Escrituras Sagradas, é ligada à uma série de conceitos, tais como o pagamento de uma dívida, resgate de um refém, ou aquisição de algo em determinadas condições. No sentido espiritual, a palavra redenção é bem próxima à palavra de libertação. No tempo de Moisés, Deus redimiu (libertou) o seu povo da escravidão egípcia. Após a sua libertação do jugo dos seus escravizadores, desde aquele momento os judeus passaram a ser a propriedade de Deus, seu Salvador (Êxodo 12:27 e 14:13: Isaías 63:9). O preço simbólico desta libertação dos judeus era o sangue do cordeiro imolado, com a qual os judeus deviam pintar as portas de suas casas. Assim foi constituído o feriado de Páscoa ainda durante o Velho Testamento, no qual, todo ano, os judeus imolavam um cordeiro imaculado, oferecendo-o a Deus. Este cordeiro de Páscoa era o protótipo do Nosso Senhor Jesus Cristo, Cordeiro de Deus, O Qual derramou o Seu precioso sangue na cruz e assim nos libertou da escravidão ao diabo e reuniu a Deus — mas já não como escravos, mas como filhos pela graça. Os antigos hebreus sabiam perfeitamente que era preciso libertá-los, redimi-los para tirar lhes a culpa. As Escrituras Sagradas ensinavam que todo pecado deve ser lavado pelo sangue. Para a sua purificação e para a redenção dos seus pecados eles imolavam diversos animais, como sacrifício a Deus. Como o apóstolo Paulo explicou na sua Epístola aos Hebreus, estes sacrifícios por si só não tinham nenhum valor purificador. Mas eles recebiam a sua força pelo futuro Sacrifício Universal do Nosso Senhor Jesus Cristo. Assim, estes sacrifícios serviam para os judeus como um protótipo do sofrimento na cruz do Nosso Senhor Jesus Cristo, o Salvador do Mundo. O profeta Isaías fala sobre este Sacrifício Universal de Messias no capítulo 53 do seu livro.

 

Nota 2. Quando o apostolo Paulo fala sobre a lei, ele se refere à Tora — i.e., os primeiros cinco livros da Bíblia (o Pentateuco) escritos pelo Moisés (Gênese, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio). A Tora se transformou, desde o começo, no código religioso-civil de leis do povo judeu. Além de normas morais (mandamentos Divinos), este código continha ainda uma grande quantidade de normas práticas, que regulavam a vida civil e familiar. Ele continha os dispositivos a respeito de diversos rituais, a observação do sábado e de diversas festas, prescrições sobre sacrifícios, sobre a comida pura e impura, leis sobre o casamento e divõrcio, regras de higiene e outros. Com o tempo estas prescrições se transformaram em leis complementares, e receberam o estatuto de obrigatoriedade. Estas leis complementares aos poucos ofuscaram a lei religioso-moral, e se transformaram num fardo pesado para o povo judeu, que era incapaz de segui-la ao pé da letra. (Mateus 23:4; Atos 15:28; Galatas 2:4). Porém, os escribas elaboraram uma fantástica casuística, que permitia com grande astúcia contornar as exigência da lei — não só rituais, como também morais. O apóstolo Paulo aqui mostra aos judeus, que a sua esperança de se justificar por rituais meramente externos é uma simples ilusão e que diante o juízo de Deus eles são pecadores maiores do que os gentios, porque eles violam conscientemente os mandamentos de Deus.

Quando o apóstolo Paulo fala sobre a abolição das obras da lei, ou simplesmente da lei, devemos entender que ele se refere ao lado ritual e formal e não aos mandamentos de Deus. Estes mandamentos não só não foram abolidos, mas os cristãos os cumprem com um rigor ainda maior. De um modo geral, a palavra obra sempre necessita de uma explicação. Há, por exemplo, obras do mal, há obras da lei, e também há obras boas — e isto tudo são conceitos diferentes. Obras boas — isto é a manifestação natural da fé e do amor. O cristão sem as obras boas é igual à uma árvore sem frutos.

 

Nota 3. Como podemos deduzir do contexto de sua epístola, quando o apóstolo Paulo fala sobre a ele se refere à uma volta radical à Deus, e não à uma aceitação racional de determinados conceitos religiosos. A verdadeira fé deve ser viva e ativa. Tal fé deve incluir o sincero reconhecimento de culpa perante Deus, um profundo arrependimento, uma sincera vontade de viver daqui para frente uma vida justa, em glória de Deus e para o bem de todos. Tal fé é ligada à profundas modificações internas. Os hebreus, que cresceram numa atmosfera de legalidade da lei do Velho Testamento não entendiam o significado da fé. Eles se acostumaram a encarar a fé do lado puramente formal: quem descende de Abraão e é circuncidado é automaticamente escolhido e justificado perante Deus. Quanto mais obras da lei cumpres, tanto mais bens receberás de Deus. A mentalidade era quase mercantil. O apóstolo prova, que tal conceito não tem nenhuma comprovação nas Escrituras Sagradas. A fé realiza esta viagem interna necessária para dirigir o homem ao caminho certo. A fé faz o homem obediente a Deus e receptível aos dons Divinos.

Para convencer os hebreus da preferência da fé ante as obras da lei, o apóstolo Paulo dedica o quarto capítulo de sua Epístola aos Romanos ao exemplo da fé de Abraão.

 

Abraão é o pai de todos que têm a fé.

(4:1-25)

Abraão, progenitor dos hebreus, árabes e alguns outros povos semitas é um dos maiores justos do Velho Testamento. Ele viveu 2.000 anos a.C., na época, em que a maioria dos homens começou a esquecer Deus verdadeiro, rendendo cultos aos deuses pagãos. Render culto aos pseudo deuses começou a ser considerado como uma coisa moderna e começou a ser enriquecido por muita suntuosidade, penetrando cada vez mais fundo na vida pública e particular dos povos do Oriente Médio. Esta tentação era tão grande, que até os parentes de Abraão, que naquela época viviam em Ur Caldeu (no Golfo Pérsico), começaram a se corromper. Para manter a fé verdadeira pelo menos num povo, Deus aparece ao Abraão e lhe manda sair da sua tribo e se mudar para um país completamente estranho para ele — a Terra de Canaã (o futuro Israel).

Naquela época, Abraão já era uma pessoa de uma certa idade e ele obedeceu a Deus, deixou os seus parentes e suas posses, e junto com a sua esposa Sara e seu sobrinho Lot se mudou para Canaã, onde começou uma vida nômade. A sua vida está descrita no livro de Gênese (11:27-25:11). Aqueles que foram obrigados a sair de sua pátria e começar a viver num país estranho, podem compreender quais as dificuldades que esperavam por Abraão. As dificuldades que vieram como a conseqüência de sua obediência eram tanto maiores, que naquela época ainda não existiam estradas, restaurantes, hotéis e nem legislação, não havia policiamento e nem sociedades humanitárias. Uma ordem mínima era conseguida apenas com o fato de que todos viviam em grandes famílias e naquelas famílias cada um apoiava e defendia os outros. Se desligar da sua família e ir morar num país estranho oferecia grandes riscos. Abraão mostrou a sua grande fé em Deus com a sua obediência.

A vida do Abraão num país estranho, entre um povo que falava uma língua desconhecida e tinha costumes estranhos, era muito dura e triste. Algumas das tribos canáneias, como por exemplo os habitantes da Sodoma e Gomorra, eram tão depravadas, que Deus os exterminou pelo fogo. Os príncipes pagãos, se aproveitando várias vezes da situação de estrangeiro de Abraão, lhe seqüestraram a bela mulher Sara. A própria vida de Abraão, estava varias vezes em perigo. Todavia, nos momentos mais difíceis Deus ajudava ao Abraão e tudo se resolvia de maneira satisfatória. Assim Deus cumpria a sua promessa de ajudar ao Abraão em tudo.

Porém Deus demorava a cumprir a sua promessa principal — de dar-lhe um filho. Passou-se um quarto de século da mudança de Abraão para Canaã e Sara não ficava grávida porque pela sua própria natureza era estéril. Neste período Abraão já conseguiu reunir muitas ovelhas e outros animais bem como outras posses,mas toda esta sua riqueza podia passar para outra pessoa. Abraão já tinha 75 anos, quando, muito triste, durante uma noite saiu um pouco da casa para descansar. Inesperadamente Deus apareceu ao Abraão e disse: "Olha o céu e conta as estrelas ... tantos descendentes terás." E mais adiante o livro de Gênese nos transmite aquelas palavras maravilhosas de Abraão, que o apóstolo Paulo lembra aos hebreus, como exemplo de obediência: "Abraão creu em Deus e isso lhe foi imputado na conta para a justificação" (Gênese 15:5-6). Pela lógica humana, era absolutamente impossível que a estéril Sara poderia gerar um filho. Se ela não podia ter um filho na sua juventude, na velhice isto era impossível. Porém Abraão não duvidou da promessa, e Deus lhe imputou isto na conta para a justificação.

Mas, mesmo assim, Deus continuou a tentar a obediência de Abraão durante mais um quarto de século e não mandava um filho para a Sara. Abraão tinha 90 anos, quando Deus lhe apareceu na forma de três peregrinos (Gênese, capítulo 17) e confirmou a Sara a sua promessa de lhe mandar um filho. E foi aqui que Deus fez a aliança com Abraão e mandou que todos os descendentes dele sejam circuncidados. E realmente, logo depois, Sara, contra todas as leis da maternidade, ficou grávida e no tempo certo deu à luz um filho, que foi chamado de Isaac. A felicidade desta família ficou completa: a fé venceu todas as leis da natureza!

O apóstolo Paulo, na sua Epístola, omite muitos detalhes destes acontecimentos, que os hebreus conheciam muito bem, mas se detém na explicação da parte principal. Abraão era justo não pela circuncisão, ou pelo cumprimento dos rituais, mas pela sua fé.

 

Que diremos ter alcançado Abraão, nosso pai segundo a carne ? Se Abraão deveras se justificou por meio de suas obras, tem de que gloriar-se. Mas não perante Deus. Pois, a Escritura não afirma: "Abraão creu em Deus e isso lhe foi imputado na conta para a justificação?" (Gênese 15:6). Ora, o salário não é uma gratificação pelo trabalho, mas uma dívida. Mas, quem, em lugar de trabalhar, crê n’Aquele que justifica o ímpio, essa sua fé é contada como justificação. Por isso Davi proclama bem-aventurado o homem a quem Deus atribui a justificação sem obras: "Bem-aventurados aqueles cujas iniqüidades foram perdoadas e cujos pecados foram cobertos! Bem-aventurado o homem cujo pecado o Senhor não toma em conta" (Salmo 31:1-2). Valerá esta bem-aventurança só para os circuncisos ou também para os incircuncisos ? Afirmamos, com efeito, que a fé de Abraão lhe foi contada na justificação. (Romanos 4:1-9).

Mas como ela lhe foi imputada ? Depois de circuncidado ou antes de circuncidado? Não foi depois da circuncisão, mas antes! De forma que ele recebeu o sinal da circuncisão como selo da justificação, obtida já antes de circuncidado, em virtude da fé. Assim, ele se tornou pai de todos os incircuncisos que crêem, para que também eles fossem justificados. Pai, outrossim, dos circuncisos, não só dos que trazem a circuncisão, mas também dos que seguem as pegadas da fé, a qual nosso pai Abraão tivera antes de circuncidado. A promessa feita a Abraão ou à sua posteridade, de serem herdeiros do mundo, não lhes foi feita em virtude da Lei, mas da justificação da fé. Pois, se os adeptos da Lei forem os herdeiros, está desvirtuada a fé e ab-rogada a promessa; porque a Lei gera o castigo da ira divina. Não havendo lei, não haveria transgressão. (Romanos 4:10-15).

 

Os hebreus achavam-se superiores pois eram descendentes de Abraão. O apóstolo Paulo explica, que além do parentesco físico, existe ainda o parentesco espiritual, que é muito mais importante. Os homens se aproximam uns dos outros muito mais por qualidades espirituais do que as físicas. Mesmo que todos os hebreus eram descendentes de Abraão, muitos deles eram lhe completamente estranhos espiritualmente, porque se recusavam a crer e se opuseram a Deus. Porém os gentios, que não tinham nenhum parentesco com Abraão, graças a sua fé se tornavam seus herdeiros espirituais. E isso justifica completamente a promessa de Deus que Abraão será o pai de muitos povos. Estes descendentes não serão tanto os descendentes físicos, como espirituais (veja esta mesma idéia na epístola aos Galatas 3:7). E foi a este parentesco espiritual que Nosso Senhor Jesus Cristo se referiu, quando disse aos hebreus acerca do centurião romano: "Digo vos, pois, que muitos irão do oriente e do ocidente assentar-se à mesa com Abraão, Isaac e Jacó no Reino dos Céus , enquanto os cidadãos do Reino (descendentes físicos — hebreus) serão lançados às trevas de fora, onde haverá pranto e ranger de dentes" (Mateus 8:11-12.)

Mais adiante o apóstolo Paulo nos lembra de um exemplo de fé ainda mais impressionante do que a fé de Abraão, quando Deus exigiu que ele imolasse o seu filho, Isaac. Este caso comovente está descrito na Gênese no capítulo 22. Naquela época Isaac tinha 12 anos. Os sacrifícios humanos eram desconhecidos na religião dos judeus. Alguns povos pagãos, na época da maior decadência da sua fé, os faziam. E mesmo assim, não obstante ao absurdo desta exigência de Deus e à maior tragédia pessoal, Abraão obedeceu a Deus. Ele colocou um maço de lenha nas costas de Isaac e começou a subir o monte Moria.. A tradição diz, que este foi o lugar, onde mais tarde, foi crucificado Nosso Senhor Jesus Cristo. Quando eles chegaram até o pico do monte, Isaac, que não suspeitava de nada, perguntou ao pai: "Aqui estão o fogo e a lenha, mas onde se acha o cordeiro para o sacrifício ?" Abraão mal conseguia conter as lágrimas, mas respondeu: "Deus providenciará o cordeiro para o sacrifício, meu filho." E somente depois que Abraão já levantou a faca para sacrificar Isaac, Deus mandou o Seu Anjo para deter Abraão do sacrifício daquele, que ele pediu durante tantos anos e quem ele amou tanto. E depois disse Deus à Abraão: "Juro-te por Mim mesmo, palavra de Javé, pois que tal coisa fizeste e não Me recusaste teu filho, teu único filho, Eu te cumularei de benção e tornarei tua descendência tão numerosa como as estrelas do céu e a areia que está na praia do mar ... todos os povos da terra serão abençoados por meio de tua descendência, (o teu descendente — i.e. Cristo, veja Epístola aos Galatas 3:16), porque obedeceste à Minha voz." Deste episódio, o apostolo tira a seguinte conclusão:

 

Logo, a herança procede da fé , comprovando-se assim ter sido em virtude de dom gratuito que está garantida a promessa para toda a descendência, tanto dos filhos da Lei como dos filhos da fé em Abraão proclamando pai de todos nós. Em verdade diz a Escritura: ‘Eu te fiz pai de muitos povos’ (Gênese 17:5). Ele é pai ante Deus, porque acreditou n’Aquele que dá vida aos mortos e existência ao que não existe. Creu ele, contra toda a esperança, na promessa; por isso é que se tornou pai de muitos povos, como lhe fora dito: ‘Assim será a tua descendência’ (Romanos 4:16-18; Gênese 15:5).

Não vacilou na fé, embora, contando quase cem anos, soubesse já desfalecido o vigor do seu corpo e definhado o seio de Sara. Contudo, à vista da promessa Divina, não desalentou, deixando-se levar pela incredulidade. Antes, fortalecido pela fé, deu glória a Deus, convicto que Ele é poderoso também para cumprir. Por isso sua fé lhe foi imputada em conta da justificação (4:19-22.)

Mas, não só por causa dele é que foi escrito que a fé lhe foi imputada na conta da justificação. Foi também por nossa causa, sendo que nossa fé deve ser-nos imputada se crermos n’Aquele que dos mortos ressuscitou Jesus, nosso Senhor, o qual foi sacrificado por nossos pecados e ressuscitado para a nossa justificação. (4:23-25.)

 

Aqui o apóstolo explica, que ao se preparar para cumprir a ordem de Deus, Abraão creu, que Deus cumprirá a Sua promessa a respeito da descendência e ressuscitará Isaac dos mortos. Esta foi uma fé tão forte, que até pode servir de exemplo no Novo Testamento.

O apóstolo explica, que ele escreve tudo isso para que nos também acreditassem na força do sacrifício redentor de Cristo, Que ressuscitou, para nos justificar e fazer herdeiros das promessas feitas ao Abraão.

Nas epístolas aos Galatas (capítulo 3) e aos Hebreus (capítulo 11) o apóstolo se refere novamente ao exemplo da fé de Abraão, dando assim exemplo de uma fé viva — uma fé que se demonstra em obras boas: Abraão verdadeiramente obedeceu a Deus (Tiago 2:20-23). Os protestantes, que contrapõem a fé às obras, tentam enfraquecer o argumento, ao qual se refere o apóstolo Paulo. M. Lutero, fundador do protestantismo, até contestava a autenticidade da epístola do apóstolo Paulo, argumentando que nesta epístola o apóstolo sublinha a importância de obras boas o que, de acordo com Lutero, contradiz a fé que justifica.

No entanto, aqui temos a mais completa má interpretação do pensamento do apóstolo Paulo a respeito da fé e das obras. Quando o apóstolo fala sobre a inutilidade das obras da lei, ele não abole obras boas, mas rituais. No contexto de tudo o que foi dito pelo apóstolo a respeito da fé de Abraão, se percebe, que toda a força e a grandeza da fé se demonstraram no ato de Abraão. A sua fé não era uma fé teórica, mas uma fé viva. Durante mais de cinqüenta anos ele superava em si mesmo as dúvidas a respeito da promessa de Deus acerca do herdeiro. Ele não se permitiu proferir nenhuma palavra de descontentamento mesmo quando Deus exigiu o sacrifício do seu filho tão esperado, mas se curvou com humildade diante da vontade de Deus. Abraão demonstrou a sua fé na mais completa obediência a Deus e devoção à Ele. Deus espera de nós a nossa completa devoção, a nossa entrega a Ele de todos os nossos pensamentos, desejos e atos, e não somente uma fria aceitação, ou um suspiro de uma efêmera inspiração, pois Ele é o nosso Guia. Devemos alcançar uma harmonia entre as nossas convicções interiores e nossa atividade exterior. A verdadeira fé obrigatoriamente age através do amor (Galatas 5:6). Ela não pode ser contraposta às obras boas — pois ela é uma parte inerente delas, assim como a alma e o corpo constituem o homem vivo.

 

Absolvição pelo sangue de Cristo.

(Romanos 5:1-11)

Após explicar a necessidade da fé, o apóstolo volta de novo para o seu tema principal a respeito do resultado da redenção de Cristo. Com o Seu sangue precioso, Nosso Senhor Jesus Cristo não só nos libertou da condenação, mas também nos trouxe grandes bens: Ele nos reconciliou com Deus, nos proporcionou a benção do Espírito Santo e a eterna felicidade no Reino dos Céus. A benção de Deus enche o coração de um fiel com uma paz indescritível e um sentimento de amor à Deus e dá-lhe forças espirituais suficientes para superar todas as provações. O apóstolo o explica nas seguintes palavras:

 

Assim, justificados pela fé, temos paz com Deus, mediante Jesus Cristo, nosso Senhor, por cuja mediação alcançamos esta graça em que agora vivemos, alimentando à esperança da glória de Deus. Não somente isso: até nos ufanamos nas tribulações. Pois estamos certos de que a tribulação engendra constância, a constância prova a fidelidade e a fidelidade, comprovada, produz a esperança. A esperança, porém, não ilude. Porque a caridade de Deus está derramada em nossos corações, pelo Espírito Santo, que nos foi dado (5:1-5).

 

Um homem, que ainda não chegou à maturidade espiritual geralmente acha difícil se conformar com as suas provações. Ele é tentado pelo seguinte pensamento: se Deus me realmente ama e cuida de mim, porque Ele deixou que a desgraça se abatesse sobre mim ? O apóstolo explica, que as desgraças e as provações são necessárias para o nosso crescimento espiritual e portanto fazem parte do plano Divino sobre a nossa salvação. Primeiro, as provações desenvolvem a paciência. O cristão se torna mais constante, mais firme e mais corajoso. Ao mesmo tempo, ele se enriquece com prática espiritual e se torna mais experiente na vida espiritual. Ao crescer espiritualmente, ele começa sentir mais a proximidade de Deus e Seu grande amor. Deste sentimento nasce na alma dele uma resposta: grande amor a Deus; ele se torna mais apaziguado e mais sereno. Agora todas estas riquezas espirituais, que antes ele só conhecia através de relatos de outras pessoas se tornam o seu patrimônio pessoal. Sem as provações, ele ficaria como um bebe no plano espiritual. Os apóstolos Tiago (Tiago 1:2-4) e Pedro (1 Pedro 1:7 e 2 Pedro 1:6) se referem da mesma forma à necessidade das provações. Falando sobre o crescimento espiritual, o apóstolo Paulo nos dá o exemplo do Nosso Senhor Jesus Cristo:

 

Quando éramos ainda fracos, morreu Cristo pelos pecadores. Dificilmente haverá quem morra por um justo. Digo: por um homem de bem, talvez haja quem se atreva a morrer. Mas Deus demonstrou Seu amor para conosco pelo fato de Cristo ter morrido por nós, quando éramos ainda pecadores. Ora, com maior razão, quando justificados pelo sangue Dele, seremos preservados por Ele da ira Divina. Se fomos reconciliados com Deus pela morte de Seu Filho, quando éramos inimigos, com maior razão, estando já reconciliados, seremos salvos por Sua vida. Ainda mais: ufanamo-nos até em Deus por Nosso Senhor Jesus Cristo, pelo qual temos alcançado a reconciliação. (5:6-11).

 

Mais adiante, o apóstolo volta para o problema do pecado, mas já não do ponto de visto de uma transgressão pessoal da vontade de Deus, mas do ponto de vista da sua força destruidora, que penetrou até a profundidade da natureza humana e a corrompe por dentro.

 

A morte veio de Adão, a vida veio de Cristo.

(5:12-21)

O apóstolo explica, que a causa primordial da nossa mortalidade não são os nossos pecados pessoais, mas aquela danificação moral, que todos nos herdamos de Adão. O apóstolo explica isto assim:

 

Por isso, como por um só homem [Adão] o pecado entrou no mundo e, pelo pecado, a morte, também a morte passou [de um homem] para todos os homens, visto que todos pecaram [no Adão]. Antes de existir a Lei [de Moisés] havia pecado no mundo. Mas o pecado não era imputado, porque não havia Lei. Contudo, a morte reinou desde Adão até Moisés, mesmo sobre aqueles que não pecaram com uma transgressão semelhante àquela de Adão, figura daquele que devia vir [Adão — Cristo]. (5:12-14).

 

Os hebreus achavam, que os homens morrem porque transgridem os mandamentos de Deus. O apóstolo objeta, que até Moisés não havia lei e portanto não tinha o que transgredir. E as transgressões da lei de consciência, que não era escrita, não eram geralmente tão sérias para serem punidas com a morte. Mas mesmo assim, mais cedo ou mais tarde, todos morriam, até mesmo crianças de colo. Deste modo, a razão da morte dos homens não é conseqüência de pecados pessoais, mas todos nos já nascemos com a natureza mortal. Esta mortalidade nos herdamos de Adão.

A ligação entre a morte do homem e o pecado foi estabelecida ainda no Éden. Ao criar Adão e instalando-o no paraíso, Deus lhe disse: "De todas as árvores do jardim podes comer à vontade. Só não podes comer da árvore da ciência do bem e do mal. No dia em que dela comeres, certamente morrerás" (Gênese 2:16-17). Na realidade, a morte, como a destruição biologia, já existia no mundo vegetal e animal ainda antes do aparecimento do primeiro homem, e consequentemente antes do pecado. Porém, pelo que diz a Bíblia, ao criar o homem conforme a Sua imagem e semelhança, Deus pretendia libertar o homem da lei geral da destruição e para isso criou no paraíso a árvore da vida. Provavelmente, os frutos desta árvore misteriosa tinham a propriedade de renovar o organismo humano, eliminando ou compensando de alguma forma o processo natural de envelhecimento do organismo. Entretanto, a biologia moderna sabe, que nem todas as células orgânicas envelhecem e morrem. Por exemplo, quando as células normais do corpo envelhecem a cada multiplicação, tanto que após uns 60 ciclos são inúteis para o organismo, as células cancerígenas se dividem e multiplicam muitas vezes, pelo visto, até infinitamente. Possivelmente, quando o homem comeu o fruto proíbido, isto trouxe alguma coisa para o organismo, que apressou o processo de envelhecimento das células. Mas, mesmo assim, conforme a Bíblia, sabemos que Adão teria a possibilidade de prolongar a sua vida física, se comesse regularmente da árvore da vida. Mas Deus não o permitiu. (Gênese 3:24), conforme explica são Gregório Teólogo, para que "o pecado não se tornasse imortal." Com a morte física do homem morre também o pecado, que mora dentro do homem. Assim, o maravilhoso sistema do Criador fez com que o castigo se tornou remédio — mesmo que só parcial. O total restabelecimento da nossa natureza foi condicionado à ressurreição de Cristo.

O problema de hereditariedade é muito complexo e, é só agora que a biologia começa a desvendar alguns de seus mistérios. O pecado original danificou a natureza do homem, não só a material, como — e principalmente — a espiritual. Assim, após a transgressão do mandamento a alma delegou ao corpo o lugar de destaque e como conseqüência, o homem se transformou num ser espiritualmente fraco, que facilmente cai na tentação da carne. Foram poucos os gigantes do espírito, tais como Abraão, Moisés ou o profeta Elias e outros parecidos com eles, que conseguiram se levantar acima do nível moral da sociedade. Mas, como sabemos da Bíblia, nem estes justos eram sempre irrepreensíveis. Sem Cristo, toda a humanidade seria condenada à escravidão do pecado e da decomposição.

Mas, assim como existe a hereditariedade fisiológica, assim existe também a espiritual. Cristo era o fundador de uma humanidade nova, renovada e a graça é mais forte que a escravidão do pecado. O Apóstolo diz:

 

Entretanto, com a graça não se dá o mesmo que com o delito. Pois, se pela falta de um só, todos morreram, com maior razão o dom de Deus e o benefício desta graça obtida por um só Homem, Jesus Cristo, superabundou para todos. Com a graça de Cristo não se dá o mesmo que com o pecado de um só homem [Adão], porque o pecado de um só ocasionou a sentença da condenação, enquanto a graça para muitos pecados é uma sentença de justificação. Porque, se pelo pecado de um só [homem] reinou a morte, devido à culpa de um só, muito mais reinarão na vida [eterna] os que receberam a abundância da graça e o dom a justificação, por obra de Jesus Cristo. (5:15-17).

 

Por outras palavras, a ressuscitadora graça de Cristo mostra a sua supremacia sobre o pecado no fato de que ela liberta o homem não só do pecado original, recebido como herança, mas também de todos os pecados pessoais e cura todas as suas doenças espirituais. De tudo isto o apóstolo faz a seguinte dedução:

 

Por conseguinte, como pelo delito de um só [homem] incorreram todos na sentença da condenação, assim também foram agraciados todos os homens, pela justiça de um só [Cristo], com a justificação que dá a vida. Assim, como pela desobediência de um só homem todos os homens se tornaram pecadores, também pela obediência de um só todos se tornarão justos. Sobrevindo a Lei [de Moisés], sobressaiu o pecado. Sobressaindo o pecado, excedeu a graça. Porque, como reinou o pecado pela morte, assim também domina a graça da justificação para a vida eterna, mediante Jesus Cristo, Nosso Senhor (5:18-21).

 

Nos tempos de Moisés, o nível moral caiu tanto, que os homens deixaram de discernir o lícito do ilícito. A finalidade dos mandamentos dados ao homem através do profeta Moisés era ajudá-los a orientar-se nos seus problemas morais e éticos e a começar a viver uma vida justa. Porém os mandamentos somente podiam aconselhar e ensinar como viver, mas não podiam dar ao homem as forças morais necessárias para lutar contra as tentações. O pecado, como era parte inerente da natureza do homem, o compelia a fazer coisas contra os mandamentos, i.e., pecar conscientemente. Por isso, a condição moral do homem após os mandamentos era ainda pior do que antes, e o pecado ficou fortalecido ainda mais.

Mas tudo isso já é o passado! No Novo Testamento, a graça da ressurreição supera qualquer obstáculo, qualquer pecado e qualquer paixão; o antigo Adão dá o lugar à um Adão novo — Cristo. Antes os homens viviam de acordo com as leis da hereditariedade física, eram escravos morais do pecado, e eram condenados a morrer. Mas, homens, renovados espiritualmente nascem do Novo Adão e eles já são libertados da escravidão do pecado, eles são repletos de uma força espiritual benéfica que conduz à vida eterna. O apóstolo explica mais adiante, de que forma o homem se inicia nesta graça de Cristo.

 

 

A Força da Graça de Cristo.

(6:1-8:39)

Nos capítulos 6 à 8 de sua Epístola o apóstolo Paulo descreve detalhadamente todas aquelas modificações profundas, que acontecem num homem de fé com a obra do Espírito Santo. A partir do momento de batismo, Deus introduz o homem numa esfera de vida nova, ainda desconhecida por ele, onde, no lugar da formalidade da lei, atua a Sua graça vivificante. A graça de Deus ilumina o raciocínio do homem com idéias boas e lúcidas, alegra o seu coração com os sentimentos puros e elevados, e o inspira a fazer obras de amor e caridade. Esta reviravolta acontece por obra de Batismo.

 

Que diremos, pois ? Continuaremos a viver no pecado, para que abunde a graça ? De modo algum! Nós, que morremos para o pecado, como continuaremos a viver nele ? Ignorais acaso que fomos batizados em Jesus Cristo, fomos batizados para participar da Sua morte ? Com Ele fomos sepultados pelo batismo, para que, participando da Sua morte, vivamos, também nós, uma vida nova, como Ele, que ressuscitou dentre os mortos pela glória do Pai (6:1-4).

Porque, se estamos incorporados Nele, pela semelhança com Sua morte, com certeza também o seremos pela semelhança com Sua ressurreição. Bem o sabemos: o nosso homem velho foi crucificado em nós, para que desapareça o corpo sujeito ao pecado, de forma a não mais vivermos escravizados ao pecado. Com efeito, quem morreu está imune ao pecado. Ora, se morremos com Cristo, temos fé que também com Ele viveremos. Pois sabemos, que Cristo tendo ressurgido dentre os mortos, já não morre: a morte já não tem poder sobre Ele; morrendo Ele, morreu uma vez só pelo pecado. Vivendo agora, vive sempre para Deus. Do mesmo modo, considerai-vos, também vós, como mortos para o pecado e vivos para Deus, em Cristo Jesus, Nosso Senhor (6:5-11).

 

Adão pecou e por isso morreu. Nós herdamos dele a natureza pecaminosa e portanto devemos morrer. Mas Cristo, como isento do pecado, não era sujeito à lei da morte e portanto podia viver eternamente no Seu corpo humano. Porém ele morreu por nós voluntariamente. A Sua morte não era a conseqüência de um pecado pessoal, mas obra do maior amor, para libertar todos dos pecados. E por isso, ao morrer na cruz, Ele deu um novo conteúdo à morte: desde então ela não é um castigo pelo pecado, mas uma eliminação do pecado. No primeiro Adão, o pecado e a morte eram companheiros inseparáveis, no segundo Adão, Cristo, o pecado e a morte se tornaram inimigos irreconciliáveis. Ao ser imerso na água de Batismo, o homem é ligado à morte redentora de Cristo e morre para o pecado.

Desta forma, o Batismo tem dois lados: o exterior — simbólico e o interior — espiritual. A imersão três vezes simboliza o sepultamento junto com Cristo e a saída da água — a ressurreição com Ele. Nestes atos do Batismo há simultaneamente uma força renovadora Divina, invisível, que limpa o homem de toda e qualquer mácula moral, lhe proporciona novas forças morais e faz do neobatizado um filho de Deus pela graça e membro do Reino dos Céus. Neste ato o homem fiel se renova para o melhor, de verdade, e não só simbolicamente. Desde este momento, ele começa sentir a necessidade de um contato pessoal com Deus, o desejo de fazer bem, ele anseia por justiça. Eis porque é tão necessário a todos que querem se batizar, se prepararem para este grande mistério com toda a seriedade; depois do Batismo, o homem deve se conter de todos os seus costumes pecaminosos e deve fazer o possível para reter em si por mais tempo possível os dons de graça recebidos no Batismo. O apóstolo diz:

 

Não reine, pois, o pecado em vosso corpo mortal, sujeitando-vos às suas paixões! Não ponhais vossos membros a serviço do pecado como armas de iniqüidade; mas, como quem ressurgiu da morte para a vida, ponde-vos, a vós e a vossos membros, quais armas de justiça, a serviço de Deus. Pois, o pecado já não deverá dominar sobre vós, por não vivermos sob o regime da Lei, mas da graça. (6:12-14).

 

O sentido deste trecho é que todos os atos do homem deixam uma certa marca no seu caráter. As obras do bem deixam bons costumes, as obras do pecado dão origem aos vícios. O Batismo limpa a sujeira moral e cura as feridas do pecado, porém não é de imediato que alisa as cicatrizes dos pecados, adquiridos durante muitos anos. Por isso, mesmo depois do Batismo, os maus costumes podem incitar o homem a cometer pecados, mas eles não o obrigarão a fazer isto. A graça do Batismo proporciona ao cristão as forças espirituais, necessárias para vencer os maus costumes, mas ao mesmo tempo, é necessária também a sua boa vontade pessoal e perseverança, para exterminar de dentro da alma todos os sinais de vícios anteriores. Deus oferece o remédio ao doente, e nos devemos usá-lo, para receber a necessária ajuda.

 

Da escravidão à uma vida nova.

(6:15-7:12).

Mais adiante, o apóstolo Paulo convoca a todos os recém batizados a trocar os seus antigos maus costumes por novos, bons. A propriedade do pecado é escravizar o homem. Antes do Batismo o homem sofre e lastima, que age mal, mas não tem forças para se livrar do vício que o escraviza. O apóstolo conclama todos os vacilantes fiéis a deixarem de ser escravos do pecado e se transformarem em escravos da justiça. E logo aqui ele explica que a obediência à justiça não é nenhuma escravidão, mas a maior liberdade interna possível:

 

Que concluir daí ? Que podemos pecar, por não vivermos sob o regime da Lei, mas da graça ? De maneira alguma! Não sabeis que, quando vos ofereceis a alguém para lhe obedecer , sois escravos daquele a quem obedeceis, quer seja do pecado para a morte, quer da obediência a Deus para a justificação ? Graças a Deus: escravos outrora do pecado, sujeitastes-vos agora de todo o coração àquela forma de doutrina que abraçastes. E, livres do pecado, passastes a servir à justiça. Em atenção à fraqueza de vossa carne, falo à maneira humana. Pois bem! Do mesmo modo que pusestes, quais escravos, vossos membros a serviço da impureza, assim os ponde agora a serviço da justiça, colimando a santidade (6:15-19).

Porque quando éreis escravos do pecado, vós vos vangloriáveis da emancipação da justiça. Que fruto tirastes, então ? Frutos de que vos envergonhais agora. O fim deles é a morte. Agora, porém, emancipados do pecado e feitos servos de Deus, colheis, como fruto, a santidade e, como prêmio, a vida eterna. Pois o salário do pecado é a morte; a graça de Deus, porém, é vida eterna em Cristo Jesus, Nosso Senhor. (6:20-23).

 

O pensamento principal do apóstolo é que seria uma pura loucura, se o cristão se deixasse escravizar por vícios anteriores. Do ponto de vista abstrato, não resta dúvida de que devemos escolher entre o bem e o mal. Mas o grande problema é que o diabo é um ótimo hipnotizador e sabe esconder o veneno mortal do pecado sob uma bonita casca do prazer. Ele incute ao homem que a indulgencia ao pecado não representa nada de horrível; Deus é misericordioso e no final das contas tudo vai sair bem. E quando o homem morde esta isca, o diabo o leva a pecados sempre maiores, lhes dizendo, que o homem é fraco demais para se opor à própria natureza. Assim, o cristão por sua própria leviandade pode cair nas redes do diabo e se envolver de novo em pecados.

Os judeus não podiam não concordar com as conclusões do apostolo Paulo acerca do estrago do pecado. Porém, eles não tinha uma idéia muito clara acerca da vantagem do cristianismo sobre a lei de Moisés. Pois bem, a lei de Moisés também condena o pecado e conclama à uma vida justa. Para que se batizar, se a lei de Moisés pode levar aos mesmos resultados ? Eles achavam, que os mandamentos de Moisés são as normas eternas para uma vida justa, e o cristianismo é um novo ensinamento, que ainda não foi verificado.

O apóstolo explica, que a lei de Moisés só podia ter um significado obrigatório até a vinda de Cristo. A lei tinha bastante tempo para ajudar aos homens se renovarem moralmente. Mas como se verificou, que ela era impotente de fazer isto, Deus resolveu aboli-la e agora oferece aos homens outro caminho da salvação. O apóstolo ilustra esta sua tese com uma referência ao casamento.

 

Ignorais, acaso, irmãos — falo a quem entende de leis — que a Lei só tem poder sobre o homem enquanto vive ? A mulher casada, por exemplo, está vinculada por lei, ao marido, enquanto este viver. Morto o marido, está livre da lei que a vinculava ao marido. Por isso, se ela se unir a outro homem, vivendo o marido, será chamada adúltera. Morrendo, porém, o marido, está livre dessa lei e não será adúltera, se tornar-se mulher de outro homem (7:1-3).

Por conseguinte, meus irmãos, estais mortos para a Lei pelo corpo de Cristo, para pertencerdes a outrem, Àquele que ressurgiu dos mortos para darmos frutos a Deus. Enquanto vivíamos segundo a carne, as paixões pecaminosas, excitadas pela Lei, produziam em nossos membros fruto para a morte. Agora, porém, emancipados da Lei, estamos mortos para ela que nos trazia presos, a fim de podermos servir conforme um espírito novo e não segundo a antiga lei (7:4-6).

 

Por outras palavras, Cristo nos libertou da escravidão ao pecado bem como dos vínculos da lei de Moisés. Agora nos podemos servir a Deus com uma alma renovada e não somente por uma obediência cega de regras velhas e antiquadas.

O apóstolo nos adverte de uma conclusão errada, de que na lei poderia estar a causa do pecado: se não houvesse a lei, não haveria também o pecado. Não, a causa do pecado se encontra no próprio homem. A lei por si só é sagrada, os seus mandamentos são sagrados, justos e levam ao bem.

 

Que diremos, pois ? Que a Lei é pecado ? De modo algum! Mas não cheguei a conhecer o pecado senão por meio da Lei. Com efeito, nada saberia da concupiscência, se a Lei não preceituasse: "Não cobiçarás!" (Êxodo 20:16-17). Servindo a Lei de ensejo, excitou-se em mim toda espécie de concupiscência; pois não existindo a Lei, estaria morto o pecado. Outrora vivia sem a Lei. Sobrevindo, porém, o mandamento, surgiu em mim o pecado (7:7-9).

E então, estou morto. Aconteceu, que o mandamento, devendo levar-me para a vida, levou-me para a morte, porque o pecado, aproveitando-se do mandamento, seduziu e por ele me acarretou a morte. A Lei é sem dúvida santa; santo, justo e bom o mandamento (7:9-12).

 

Podemos perceber, que o apóstolo se volta de novo para o problema do pecado. No começo de sua epístola (Romanos 1:18-3:20), ele constatou o fato da natureza pecaminosa do homem, na sua segunda parte (Romanos 5:12-21) ele explicou, que todos os homens já nascem com a natureza danificada pelo pecado. Agora ele é ainda mais enfático na explicação, que ninguém se pode livrar do pecado e de sua ação destruidora por si só, só com as suas próprias forças.

 

O conflito interno.

(7:13-25)

 

Uma coisa boa se tornou, então, causa de morte ? Nada disso! Pelo contrário, foi o pecado que, para revelar toda a sua malícia, me acarretou a morte por aquilo que fora bom, patenteado, em vista do mandamento, sua extrema malícia. (7:13).

A Lei, bem o sabemos, é espiritual, enquanto que eu sou carnal, vendido ao pecado. Pois, não entendo o que faço. Não pratico aquilo que quero e faço o que aborreço. Ora, fazendo o que não quero, reconheço que a Lei é boa. Neste caso, porém, já não sou eu quem age, mas sim o pecado que habita em mim. Pois sei, que em mim, isto é, em minha carne, não habita o bem. Capaz eu sou de querer o bem, mas não de executá-lo (7;14-18).

Com efeito, não faço o bem que quero; mas o que não quero, o mal, eu o pratico. Ora, se faço o que não quero, então não sou eu quem age senão o pecado que habita em mim (7:19-20).

 

Este é um dos poucos lugares nas Escrituras Sagradas, onde com tanta clareza e tão tragicamente o homem é mostrado como um ser tão indefeso moralmente antes da vinda do Nosso Senhor Jesus Cristo.

 

Sinto imperar em mim uma lei: querendo fazer o bem, eis que o mal se apresenta a mim. Segundo o homem interior, acho satisfação na Lei de Deus; mas em meus membros experimento outra lei que se opõe à lei do meu espírito e me encadeia à lei do pecado que reina em meus membros (7:21-23).

Homem infeliz que sou! Quem me libertará desse corpo da morte! Graças sejam dadas a Deus! Fui libertado por Jesus Cristo, Nosso Senhor. Dá-se pois o seguinte: sirvo com o espírito à Lei de Deus e com a carne à lei do pecado (7:24-26).

 

Esta última frase é a síntese de tudo que foi dito até agora: o homem é moralmente dividido — a natureza material manda ele pecar e a alma, apesar de querer o bem, não tem a força suficiente para vencer a carne.

Assim, o apóstolo usou todos estes sete capítulos para mostrar, com tanta clareza, ao homem toda a força destruidora do pecado e para convencer ao leitor de que é imprescindível procurar uma ajuda sobrenatural para lutar contra o mal em si mesmo. Nem a voz da consciência, nem os mandamentos diretos da lei, nem o medo do eterno tormento puderam reter o homem de atos pecaminosos. Isto é possível somente pela força Divina, que chega ao homem através a sua fé em Cristo Redentor.

Devemos lembrar-nos de que os ensinamentos do apóstolo mencionados acima são tão atuais nos dias de hoje, como eram 2000 anos atrás. A humanidade continua a sofrer por causa de seus problemas morais: injustiça, mentira, violência, guerras e os mais diversos crimes. Os estadistas e os lideres sociais não entendem, que o problema principal de todos os males é a danificação moral da natureza humana. Podemos editar uma infinidade de belas leis, inventar diversas organizações para lutar contra a criminalidade e outros males sociais. Mas estas medidas humanas são iguais à compressas na luta contra o câncer. É necessário um remédio radical e potente, para exterminar todas as raízes do mal dentro do homem. Este remédio é nos dado pelo Nosso Senhor Jesus Cristo. Na realidade, agora se repete o erro dos antigos adeptos da lei de Moisés, os quais declinavam a ajuda de Deus e tentavam se tornar justos somente por seus próprios meios e suas próprias forças e nesta sua ilusão se tornaram tão ferozes, que rejeitaram o maior Justo de todos os justos e o condenaram a morrer na cruz!

Somente Aquele Que criou o nosso coração espiritual pode curá-lô. Nosso Senhor Jesus Cristo extermina dentro de nos todas as raízes do mal e nos dá forças para vivermos uma vida justa. O grande obstáculo para resolver os problemas sociais se encontra hoje em dia em ensinamentos modernos, pseudo-científicos e religioso-filosóficos que rejeitam a própria existência do pecado e dizem, que todos os nossos desejos são completamente naturais e normais. Se alguém erra em alguma coisa, ou faz algo incorretamente, isto acontece somente por causa de imaturidade e ignorância. Espera um pouco e ele mesmo compreenderá, como se corrigir. É exatamente esta oportunidade, que o diabo espera! Deixa todos pensarem, que o mal é uma simples ilusão ou então uma curva temporária no caminho da evolução espiritual. Se nos não compreendermos o problema do pecado e não nos voltaremos a Cristo, com humildade e arrependimento, permaneceremos todos escravos do diabo, condenados à perdição. Sem Deus não há evolução, somente degeneração!

 

No seguinte capítulo o apóstolo fala com mais detalhes sobre a graça Divina e sobre a vida espiritual.

 

A vida no Espírito Santo.

(8:1-11)

Após a explicação do sacrifício de Cristo Redentor, o apóstolo quer convencer os cristãos a viver uma vida mais espiritual, com a ajuda da graça de Cristo. Ele diz:

 

Doravante, pois, não pesa condenação alguma sobre os que estão em Cristo Jesus. Porque a lei do espírito, que vivifica em Cristo Jesus, te livrou da lei do pecado e da morte. O que, na verdade, era impossível à Lei [de Moisés] debilitada pelo poder da carne, isto fez Deus, o Qual, enviando Seu próprio Filho com uma carne semelhante à carne do pecado, em vista do pecado, condenou o pecado na carne, a fim de que as exigências justas da Lei se cumprissem em nós, que já não vivemos ao sabor da carne, mas segundo o espírito. Quem vive ao sabor da carne, aspira as coisas da carne; quem, porém, vive segundo o espírito, aspira as coisas do espírito. Tudo quanto aspira a carne é morte; tudo quanto aspira espírito é vida e paz. O apetite da carne é inimigo de Deus, pois não se sujeita à lei de Deus, nem o pode. Quem vive ao sabor da carne, não pode agradar a Deus (8:1-8).

 

Isto pode ser colocado em frase da seguinte forma: Até a chegada de Cristo, diabo se achava no direito de mandar na carne do homem, porque o homem pecou e assim se submeteu voluntariamente a ele. O diabo se fez como que um carrasco dos culpados; e do ponto de vista da formalidade, ele até tinha razão: ao atormentar e matar os pecadores, ele matava aquilo que era digno de morte. Mas aí apareceu Cristo em carne. No lugar de se retirar ante a santidade de Cristo, o diabo começou a lutar contra Ele com todo o seu ódio e no final das contas através dos pecadores que eram seus subordinados, ele conseguiu a sentença da morte de Cristo, o Qual, sem pecado, não era submetido nem à ele, nem à morte. O diabo visivelmente transgrediu os seus direitos e assim rompeu toda e qualquer justiça. Por isso, pela justiça de Deus, ele perdeu o seu domínio anterior sobre a carne humana, a qual se juntou à Cristo através do Batismo. Assim sendo, o diabo foi derrotado pela carne de Cristo. E por causa da ressurreição de Cristo os homens se livraram da escravidão do diabo e receberam a possibilidade de viver uma vida espiritual. O apóstolo diz:

 

Vós, porém, não viveis segundo a carne, mas segundo o espírito, se é que realmente o Espírito de Deus habita em vós. Quem não possui o Espírito de Cristo não pertence a Cristo. Se Cristo reinar em vós, embora o corpo esteja sujeito à morte, em conseqüência do pecado, vive o espírito por causa da justificação. Se habita em vós o Espírito d’Aquele que dentre os mortos ressuscitou a Jesus, Ele, então, que ressuscitou a Cristo Jesus dos mortos, dará também vida a vossos corpos mortais, em virtude de Seu Espírito que habita em vós (8:9-11).

 

A alegria de sermos adotados por Deus.

(8:12-17)

Nos somos guiados pelo Espírito Santo, nos somos filhos de Deus e por isso herdeiros de Sua glória, com a condição de que não nos recusamos a participar dos Seus sofrimentos:

 

Portanto, irmãos, nada devemos à carne, para vivermos segundo a carne. Porque, se viverdes segundo a carne, morrereis! Se, ao contrário, mortificardes, pelo Espírito, as obras das carnes, vivereis. Pois todos os que são guiados pelo Espírito de Deus, são filhos de Deus. Não recebestes, com efeito, o espírito da escravidão, para ainda viverdes com temor, mas recebestes o Espírito de filiação Que nos faz clamar: Abba! (Pai)! O próprio Espírito dá testemunho ao nosso espírito de que somos filhos de Deus. Ora, se somos filhos, somos também herdeiros; herdeiros de Deus e co-herdeiros de Cristo, se com Ele padecermos, para sermos igualmente glorificados com Ele. (8:12-17).

 

A glória vindoura.

(8:18-30)

Da mesma forma como é mais fácil descer um declive, do que subí-lô, assim é mais fácil pecar, do que viver uma vida justa. Sabemos, pela própria experiência, que para conseguirmos algo bom e útil, devemos trabalhar com muita perseverança. Por isso, não devemos ter medo de dificuldades e provações, como de algo anormal, mas antes aceitá-las como os degraus, pelos quais ascendemos ao Reino do Céu. O apóstolo nos explica isto no contexto da vindoura renovação de toda a natureza:

 

Pois, tenho por certo que os padecimentos do tempo presente não têm proporção com a glória futura que em vós se há de manifestar. Em contínuos anelos a criação aguarda por esta manifestação dos filhos de Deus. Pois, as criaturas ficaram sujeitas à degradação, não por sua vontade, mas em razão de quem as sujeitou, na esperança de serem libertadas, também elas, da escravidão da corrupção, para participarem da liberdade gloriosa dos filhos de Deus. Bem que sabemos que a criação inteira geme até agora, suspirando, transida de dor, por novo nascimento. Mas não somente ela, senão também nós mesmos, que possuímos as primícias do Espírito, gememos em nosso interior, esperando a filiação adotiva, a redenção do nosso corpo. Em verdade, temos sidos salvos na esperança. Como ainda pode esperar alguém o que vê? Se esperarmos, ao contrário, o que não vemos é com paciência que o aguardamos. (8:18-25).

 

Em outras palavras, o mundo inteiro criado pelo Criador — todo o mundo animal e vegetal incomoda-se com a correria e futilidade atual e espera por sua renovação. Naturalmente, eles esperam inconscientemente, apesar de que alguns animais mais desenvolvidos podem ter alguma esperança subconsciente de alguma vida mais perfeita. O principal pensamento do apóstolo é de que a natureza foi criada por Deus ainda na sua forma imperfeita, pois cabia ao homem, a obra-prima da criação, ainda atingir a perfeição com o seu próprio empenho. Quando a parte fiel dos homens chegar à este grau de evolução, aí também todo o mundo físico será renovado e se transformará num novo céu e uma nova terra (veja 2 Pedro, 3:13). Aí, na ressurreição global dos mortos, toda a natureza será renovada e toda a criação, junto com o homem será libertada das leis atuais de decomposição e destruição. Que aspecto terá a natureza? Será que lá teremos os animais e as plantas, por nos conhecidas? O apóstolo deixa estas perguntas sem resposta. Na Bíblia existem algumas alusões ao que o mundo novo será parecido com aquele que conhecemos hoje (Isaías 11:6-9, Isaías 65:17-25, Apocalipse 21 e 22). Mas isto tudo são somente suposições, pois naquele mundo espiritualizado o tempo, o espaço e todas as leis terão outro conteúdo.

O Espírito Santo nos acompanha à cada nosso passo de ascensão à Deus e nos ajuda. Ele nos ensina o que devemos almejar, o que devemos desejar e o que devemos pedir a Deus; é Ele que eleva as nossas preces ao Trono Divino.

 

Por isso o Espírito Santo vem em auxílio de nossa fraqueza, porque não sabemos o que havemos de pedir como convém. Mas o próprio Espírito intercede por nós com gemidos inenarráveis. Aquele, porém, que esquadrinha os corações, conhece qual é o desejo do Espírito, porque Ele intercede pelos santos, segundo a vontade de Deus. (8:26-27).

 

O apóstolo nos lembra, de que desde a eternidade Deus determinou nos salvar. Ele cuida de nos constantemente, e transforma tudo - tanto o agradável, como o triste, para o nosso bem e nos leva à salvação.

 

Sabemos que todas as coisas concorrem para o bem dos que amam a Deus, dos que, conforme Seus desígnios, são chamados. Os que Ele de antemão conheceu, também os predestinou para serem semelhantes à imagem de Seu Filho, para que Este seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou, também os chamou, e aos que chamou, também os justificou, e aos que justificou, também os glorificou (8:28-30).

 

Aqui nós não temos uma predestinação determinada, como ensinam algumas seitas, mas uma predestinação, que é baseada na onisciência Divina. Deus não predeterminou arbitrariamente alguns para a salvação e outros para a perdição, mas como onisciente, Ele sabia de que forma cada um de nós utilizará a liberdade recebida de Deus.

 

O amor de Deus é tudo para nós.

(8:31-39).

Como epílogo do seu ensinamento sobre a justificação pela graça de Cristo, o apóstolo eleva os pensamentos e os sentimentos dos leitores à recepção do onipotente amor de Deus, o que resulta no seguinte hino à graça de Deus:

 

Que concluiremos então? Se Deus é por nós, quem será contra nós? Ele, que não poupou ao Próprio Filho, mas O entregou por todos nós, como não nos daria tudo juntamente com Ele? Quem se atreveria a acusar os eleitos de Deus? Deus é Quem os justifica! Quem os condenará? Jesus Cristo Que morreu, ou Que ressuscitou e se acha à direita de Deus, intercedendo por nós? (8:31-34).

Quem nos separará de amor de Cristo? Tribulação, ou aflição, ou perseguição, ou fome, ou nudez, ou perigo, ou espada? Pois está escrito: Por causa de Ti padecemos morte dia por dia; somos tratados como ovelhas destinadas ao matadouro. (Romanos 8:35-36; Salmos 43:23).

De tudo isso, porém, saímos vencedores por meio d’Aquele que nos amou. Estou persuadido que nem morte, nem vida, nem anjos, nem principados, nem coisas presentes, nem futuras, nem potestades, nem altitude, nem profundeza, nem outra criatura qualquer nos poderá separar do amor que Deus nos manifesta em Cristo Jesus, Nosso Senhor (Romanos 8:37-39).

 

 

A Missão de Israel.

(Romanos 9:1-11:36).

O apóstolo Paulo amou o seu povo com todo o seu ardor, e o seu coração sangrava quando percebia, que muitos dos seus conterrâneos eram contra a pregação do Evangelho. O apóstolo percebia aqui a trágica diferença entre o que deveria ser conforme as promessas dos profetas e o que acontecia na prática. Quando Deus preparava os judeus à vinda de Messias, Ele os deu a honra de serem os primeiros habitantes do Reino de Deus e pregadores da verdadeira fé no meio de outros povos. Mas, o apóstolo se convencia, dia a dia, que os seus compatriotas não se portam como um povo eleito por Deus, mas antes, são contra Deus. Ao mesmo tempo, os gentios, que até agora eram muito afastados de tudo divino, agora, pelo contrário, são muito receptivos ao Evangelho.

O apóstolo Paulo se perguntava muitas vezes: será que foi em vão que Deus chamou o povo de Israel e lhe prometeu tantas graças. O apóstolo acha a resposta no fato de que existem duas categorias dos israelitas: israelitas étnicos e israelitas do espírito. Todos, que aceitam a pregação de Evangelho, judeus ou gentios, são verdadeiros israelitas e filhos de Abraão. Porque é a fé que aproxima as diversas nações e os congrega numa única nação eleita, que se chama Israel. Porém os judeus que não têm fé, são, por seu espírito, completamente estranhos tanto a Abraão, como ao próprio Deus. Mas, não obstante a obstinação da maior parte da população, o apóstolo percebe que no seio do povo judeu ainda há um ramo vivo, que é capaz de aceitar Cristo. Isto acontecerá no final dos tempos.

Nos três capítulos seguintes da sua Epístola aos Romanos, (9 a 11), o apóstolo discute de uma forma abrangente esta questão que o emociona. Esta parte da Epístola é uma pesquisa completamente separada e finalizada, onde ele desvenda a providência Divina nos destinos dos povos. Ele comprova as suas conclusões por numerosas citações de Escrituras Sagradas, principalmente, de profeta Isaías.

 

A providencia Divina nos destinos dos povos.

(9:1-33)

O apóstolo se entristece profundamente com o seu povo, o qual durante tantos anos ele tentou converter à Cristo:

 

Digo a verdade em Cristo, não minto, atesta-me minha consciência no Espírito Santo: grande é a minha tristeza e incessante a dor de meu coração. Quisera eu, em pessoa, ser separado da comunhão com Cristo em prol de meus irmãos de raça. Esses são os israelitas, aos quais se outorgou a filiação adotiva, a glória, as alianças, a legislação, o culto e as promessas, e os patriarcas de quem descende o Cristo quanto à carne, que é Deus acima de tudo, bendito para sempre. Amém! (9:1-5).

 

Como aconteceu, e como compreender, que o povo, que foi escolhido por Senhor e a quem Ele queria dar tantos bens, se virou contra Ele? O apóstolo procura a resposta na Bíblia e chega à conclusão, de que a escolha Divina não se define por propriedades físicas, mas espirituais. O apóstolo diz:

 

[Eles perecem] não porque falhou a palavra de Deus, pois nem todos que descendem de Israel são verdadeiros israelitas. Nem todos os descendentes de Abraão são seus filhos verdadeiros, mas: ‘Só de Isaac é que se reconhecerá tua descendência’ (Gênese, 21;12). Isto que dizer, que não são os filhos carnais que são filhos de Deus; mas, só os filhos da promessa é que serão seus descendentes. Pois, os termos da promessa diziam o seguinte: ‘Dentro de um ano voltarei e Sara terá um filho’ (Gênese 18:10). Não só ela, mas também Rebeca, que conceberá filhos de um só varão, de nosso pai Isaac. Pois bem, quando eles ainda não tinham nascido, nem praticado bem ou mal algum, para que o desígnio da eleição Divina ficasse em pé, não à conta de obras, mas de quem chama, foi dito a ela: ‘O mais velho servirá ao mais moço’ (Gênese 25:23), conforme o que está escrito: ‘Amei a Jacó, odiei, porém, a Esaú’ (Romanos 9:6-13; Malaquias 1:2).

 

Aqui o pensamento principal é que Deus escolhe o homem não por suas qualidades exteriores, mas interiores. Confirmando este seu pensamento o apóstolo nos dá como exemplo Abraão, o qual teve outros filhos além de Isaac (entre eles, Ismael da criada deles, Agar). O apóstolo diz, que a benção de Deus, evitando outros filhos de Abraão, entre eles Ismael, pousou somente sobre um deles — Isaac. Da mesma forma, entre todos os filhos de Isaac, só um foi abençoado — o mais novo Jacó, ao mesmo tempo que o mais velho Esaú, que era o primogênito, foi rejeitado.

Ao mesmo tempo, o apóstolo nos dá o exemplo de um eleito "negativo," quando Deus usa a sanha de um homem para mostrar a Sua onipotência para o proveito dos outros. Assim por exemplo, durante a vida do profeta Moisés, Deus permitiu ao orgulhoso faraó de se opor à sua ordem de libertar o povo hebreu da escravidão. Como resultado desta oposição do faraó Deus castigou o Egito com grandes calamidades e assim demonstrou a Sua superioridade ante os deuses pagãos, que não puderam defender os egípcios. Todos estes acontecimentos milagrosos, descritos no livro de Êxodo (capítulos 7 a 14), tiveram por finalidade comprovar não só a hebreus, mas também aos egípcios e outros povos, que há só um único Deus, Criador do céu e da terra. Deus poderia vencer o faraó e a sua corte num só instante e assim libertar os hebreus, mas Ele escolheu um outro caminho, mais lento, visando o proveito espiritual de todos. Como dizem as Escrituras Sagradas, Deus exacerbou o coração do faraó, em outras palavras, como que fez ele de propósito obstinado e cruel, quando, na realidade, Ele somente deixou o faraó agir contra a vontade Dele. No entanto, os profetas antigos não faziam diferença entre a vontade que age e a vontade que deixa os outros agirem: permitir para eles era a mesma coisa que fazer. E o apóstolo Paulo usa a mesma terminologia.

 

Que decorre disto? Que há acaso injustiça de Deus? De modo algum! Disse Ele a Moisés: "Farei misericórdia a quem Me aprouver fazer misericórdia e terei compaixão de quem Me aprouver ter compaixão." Por conseguinte, não depende a eleição daquele que quer, nem daquele que corre, mas de quem usa de misericórdia. Pois, afirma a Escritura ao faraó: "Por isto é que te suscitei, afim de manifestar em ti o Meu poder e dar a conhecer em todo o mundo o Meu Nome." Logo, Ele se compadece de quem quer e torna obstinado a quem quer (9:14-18).

 

Pertence a Deus, que é o Soberano de todo o universo, decidir a quem perdoar e a quem castigar. Nas mãos Dele estão os destinos tanto de cada homem assim como de todos os povos, e Ele não presta conta a ninguém. Mas, como Ele é absolutamente justo, Ele manda a cada um exatamente aquilo, que ele precisa. O apóstolo explica isto da seguinte forma:

 

Objetar-me-ás então: "Por que Ele nos vitupera ainda? Quem será capaz de resistir à Sua vontade?" Quem é tu, enfim, ó homem, para disputar com Deus? "Poderá dizer acaso a obra ao artífice: ‘Por que me fizeste assim?’ " Acaso, o modelador não pode formar da mesma massa um vaso luxuoso ou um vaso ordinário? Deus, porém, para manifestar a Sua ira e dar a conhecer o Seu poder, suportou com muita longanimidade os objetos da ira votados à perdição. E, para ostentar a riqueza de Sua glória, em objetos de misericórdia, a estes predestinou para a glória, a saber, a nós a quem Ele chamou, não só dentre os judeus, senão também entre os gentios. Como Ele diz por Oséias: "Chamarei de meu povo a quem não era Meu povo e de amada a que não era amada" (Oséias 2:23). "E onde lhes foi dito: ‘Não sois o Meu povo’, aí serão chamados ‘Filhos de Deus Vivo’" (Oséias 1:10). Isaías exclama, referindo-se a Israel: "Se o número dos filhos de Israel fôr como a areia do mar, salvar-se-á o resto, porque o Senhor cumprirá Sua palavra plena e irrevogavelmente sobre a terra" (Isaías 10:20-22). E predisse ainda Isaías: "Se o Senhor Sabaot não nos deixara um resto, seríamos como Sodoma e nos parecíamos com Gomorra" (Romanos 9:19-29; Isaías 1:9).

 

Os trechos supra citados profetizam, de um lado, a conversão dos gentios, e por outro lado — a repudia do povo hebreu por causa da sua falta de fé. Daí vem a conclusão de que as promessas de Deus são condicionadas ao futuro comportamento humano. Aqueles hebreus, que acreditaram, receberão o que lhes foi prometido, e aqueles que se recusaram a acreditar, serão repudiados. No entanto, Deus guarda no povo judeu ainda um certo "resto," ou melhor, uma minoria, que não perdeu a capacidade de acreditar. Realmente, ao longo de toda a historia de cristianismo, sempre houve certos judeus que, não obstante a resistência de seus parentes e familiares infiéis, abraçavam o cristianismo e se juntavam à Igreja. No capítulo 11 da sua Epístola, o apóstolo prevê a conversão em massa dos judeus no final dos tempos.

O apóstolo acha, que a razão da resistência dos judeus está insistência deles de serem justificados pelos rituais; eles não querem se submeter-se à justificação que provem da fé em Jesus Cristo.

 

Que se segue daí? Que os gentios, apesar de não buscar a justiça, alcançaram a justificação pela fé, ao passo que Israel, colimando uma norma de justificação, não atingiu esta norma. Porque não? Porque pretendiam atingí-la, não pelo caminho da fé, mas pelo das obras. Tropeçaram na pedra de obstáculo, conforme está escrito: "Eis que ponho em Sião uma pedra de tropeço e uma rocha de escândalo. Mas quem crê Nele, não será confundido" (Romanos 9:30-33; Isaías 28:16; 8:14).

 

Conforme o plano Divino, todos os fiéis de todos os povos deveriam formar uma família espiritual — o Reino do Messias. Os profetas comparavam este Reino à um prédio maravilhoso, construído no topo do monte Sião (Sião é o nome do monte, onde se encontrava o templo de Jerusalém e o palácio do rei ) e Messias, ao fundador do Reino de Deus — a Pedra angular. Uma dessas profecias, que enfatiza o significado da fé, é citada pelo apóstolo Paulo: "Mas quem crê Nele, não será confundido" (Isaías 28:16). O Salmo 117 diz o seguinte sobre esta Pedra-Cristo: "A Pedra rejeitada pelos arquitetos se fez a Pedra angular. Isto vem de Deus e é maravilhoso diante dos nossos olhos ." Isto significa, que apesar de que os líderes espirituais e políticos do povo judeu, que deveriam tomar a mais ativa parte na fundação do Reino de Deus, rejeitaram o Fundador deste Reino, Deus O fez a Pedra angular.

Mais adiante o apóstolo passa a analisar a crise espiritual do povo hebreu.

 

O mal do Israel é a sua falta de fé.

(10:1-21)

A finalidade da lei de Moisés era a de preparar o povo para a aceitação do Messias. A idéia dessa lei era que os ritos, as festas e os rituais deveriam servir só de um invólucro externo para uma melhor integridade e assimilação da essência espiritual da lei. Mas os judeus se apaixonaram tanto pela face externa da lei, que perderam sensibilidade do lado espiritual; quando afinal chegou Messias, eles não O reconheceram. Quando Cristo os conclamava para as obras da fé, eles insistiam no cumprimento exato de todas as antigas tradições. O apóstolo o descreve assim:

 

Irmãos, o apelo do meu coração e a súplica que por eles dirijo a Deus, é que se salvem. Declaro, em seu favor, que têm zelo de Deus, muito embora inconsiderado. Pois, negando-se a reconhecer a justiça que vem de Deus, e procurando estabelecer a sua própria, não se sujeitaram à justiça que vem de Deus. O termo final da Lei (de Moisés) é Cristo, que justifica todo aquele que crê. (10:1-4).

Moisés, com efeito, escreve: "O homem que cumpriu a justiça nascida da Lei viverá por ela" (Levíticus 18:5). Porém a justiça que vem da fé diz: "Quem subirá ao céu?" isto é, para fazer Cristo descer do alto; ou: "Quem descerá ao abismo?" isto é, para reconduzir Cristo dentre os mortos. Que diz ela então? "Perto de ti está a palavra, em tua boca e em teu coração," o que significa: a palavra da fé que pregamos. (Deuteronômio 30:12-14). Porque, se com tua boca confessares que Jesus é o Senhor e, em teu coração, crês que Deus o ressuscitou dos mortos, serás salvo. Pois, é com o coração que se crê, alcançando-se a justiça. Crendo-se com o coração é que se alcança a justificação e confessando-se com a boca consegue-se a salvação. Diz a Escritura: "Ninguém que Nele crê será confundido" (Isaías 28:16). Assim, não há diferença entre judeu e gentio: todos têm o mesmo Senhor, rico para com os que O invocam. Porque, "todo aquele que invocar o nome do Senhor, será salvo" (Romanos 10:5-13; Joel 2:32).

 

A doutrina de Cristo parecia aos judeus nova e estranha. No entanto, ela deveria ser muito familiar a alma deles, porque ela emanava de Deus, que criou a alma, segundo a Sua imagem. As palavras citadas do Deuteronômio: "Não fales no teu coração ..." querem dizer que o sentimento religioso é inato no homem. O homem que busca a justiça de verdade, não pode se acomodar nos rituais externos: ele tem sede de um contato vivo com Deus. Em princípio, o homem de qualquer nação pode crer em Deus e amá-Lo. Por isso, no Reino do Messias toda e qualquer diferença, seja racial, social, cultural ou qualquer outra perdem o seu significado e todos os fiéis se fundem num único povo — o novo Israel. E todas as promessas de todos os profetas se referem à este novo Israel.

Para que se possa acreditar no ensinamento de Cristo, é necessário ouvi-lo, e para ouvi-lo são necessários os pregadores. O apóstolo cita alguns trechos das Escrituras, que profetizam a pregação universal do Evangelho. Os hebreus se afastaram da fé não por causa da falta das profecias, mas porque se recusaram a crer, e por isso têm culpa perante Deus. Porém os gentios, que eram livres de preconceitos acerca dos rituais, eram mais receptivos ao cristianismo.

 

Logo, como invocarão Aquele em Que não creram? Como crerão Naquele de Quem não ouviram? Como ouvirão falar, se não houver quem pregue? E como pregarão, se não forem mandados, como diz a Escritura: "Quão formosos são os pés dos que anunciaram boas-novas!" (Isaías 52:7). Nem todos, porém, ouviram a boa-nova. Pois, Isaías exclama: "Senhor, quem deu fé à nossa pregação?" (Isaías 53:1). A fé, portanto, depende da pregação, e a pregação se faz por causa da palavra de Cristo. (Romanos 10:14-17).

Mas, pergunto: porventura não chegaram eles a ouvir? Certamente que sim. "Por toda a terra se difundiu a voz deles e até aos confins da terra as suas palavras" (Salmo 18:15). Entretanto, pergunto: Israel acaso não o compreendeu? Já Moisés lhe havia dito: "Eu vos tornarei ciumentos de um povo que não é povo; provocarei vossa ira contra um povo insensato" (Deuteronômio 32:21). E Isaías se atreve a dizer: "Fui achado pelos que não Me procuravam; manifestei-Me aos que não perguntavam por Mim" (Isaías 65:1). A Israel por seu turno diz: "Todo dia estendi Minhas mãos a um povo desobediente e rebelde" (Romanos 10:18-21; Isaías 65:2).

 

Todas estas citações do Velho Testamento comprovam a conclusão do apóstolo, que só os hebreus são culpados de se terem distanciados de Deus.

 

A conversão vindoura do Israel.

(11:1-36)

Igual à uma águia, que paira lá nas alturas, o apóstolo Paulo contempla com a sua visão profética os futuros destinos da humanidade. Ele prevê, que no caminho histórico de Israel haverá uma conversão maciça para a fé em Cristo.

 

Ora, pergunto: "Porventura, rejeitou Deus o Seu povo?" De modo algum! Não sou eu também israelita, da linhagem de Abraão, da tribo de Benjamim? Logo, Deus não rejeitou Seu povo eleito. Ou não sabeis o que diz a Escritura sobre Elias, quando ele acusava Israel perante Deus: "Senhor, mataram os Teus profetas, derrubaram os Teus altares. Só eu fiquei e me procuram tirar a vida"? (3 Reis 19:14). E o que lhe respondeu Deus? "Reservei para Mim sete mil homens que não dobraram o joelho a Baal" (3 Reis 19:18). Assim, também no tempo presente subsiste um resto, em vista da eleição da graça. E se é pela graça já não o é pelas obras; do contrário, a graça não seria graça (Romanos 11:1-6).

Que se segue, pois? Que Israel não conseguiu o que buscava, mas o alcançaram os eleitos, ao passo que os restantes ficaram obcecados, como está escrito: "Deus lhes deu um espírito de torpor, olhos para não verem e ouvidos para não ouvirem até hoje" (Isaías 29:10: Deuteronomio, 29:4). Diz Davi ainda: "Converta-se a mesa deles em laço e cilada: em tropeço a justa paga! Obscurecem-se-lhes os olhos, para não verem, e Tu encurva-lhes sempre a cerviz" (Romanos 11:7-10: Salmos 68:23-24).

 

A obstinada falta de fé dos judeus fez com que o apóstolo se voltasse a pregar aos gentios. Mas, dentro o povo judeu se conservou um ramo vivo, invisível ao olho material, a qual no seu devido tempo florescerá. O apóstolo lembra, que já houve uma parecida loucura ainda no tempo do profeta Elias, 700 anos antes Cristo, quando a grande maioria dos judeus se voltou a adoração dos falsos deuses pagãos, o que naquela época estava na moda. A ímpia Jesebel, esposa do rei judeu Acab, começou a perseguir os fieis, os que creram em verdadeiro Deus e começou a exterminar os Seus profetas. Para salvar a sua vida, o profeta Elias se refugiou num deserto intransitável. Estando deprimido ao máximo, ele se queixa a Deus do seu povo. Parece-lhe, que tudo está acabado, e que de agora em diante os israelitas adorarão unicamente o deus Baal. Mas Deus o reconforta, revelando-lhe, que no meio do povo de Israel Ele guardou "sete mil homens, que não dobraram o joelho a Baal." Da mesma forma, como no decurso de toda a história de Israel houve altos e baixos em relação a fé, assim também o apóstolo prevê, que também no futuro haverá uma conversão dos judeus à Cristo.

 

Por isso, pergunto: acaso tropeçaram, para que caíssem? De forma alguma! Mas foi para incitar à emulação, por caber aos gentios, devido à queda. Ora, se a sua queda reverte em riqueza para o mundo e, a sua decadência, em riqueza para os gentios, o que não será sua conversão em massa? (11:11-12).

 

A resistência dos judeus ao cristianismo teve como conseqüência, que os apóstolos e seus sucessores voltaram toda a sua energia missionária para a conversão dos povos gentios. Esta pregação teve um enorme sucesso entre os gentios, e os convertidos cristãos entraram para o povo do Novo Israel. O apóstolo usa uma metáfora, comparando o povo de Deus à uma oliveira nobre, que durante muitos séculos dá bons frutos a Deus. No começo esta oliveira consistia exclusivamente de justos do Antigo Testamento, os descendentes de Abraão, e os povos pagãos permaneciam estéreis, como uma oliveira brava. Mas agora, ao crer em Cristo, muitos ramos desta oliveira brava se "enxertaram" à existente "oliveira verdadeira nobre" e os judeus infiéis se desprenderam da sua árvore e caíram.

Porém, os gentios convertidos não devem se orgulhar demais, pois a queda dos judeus infiéis não é definitiva. Além do mais, ninguém é seguro que não se "desprende" e peca.

 

E a vós, gentios, vos digo: como apóstolo dos gentios, honrarei meu ministério, visando estimular de algum modo à emulação os homens da minha raça, para salvar alguns deles. Porque se por sua reprovação resultou a reconciliação do mundo, que serão efeito de sua reintegração senão uma ressurreição dentre os mortos? Se as primícias são santas, também o é a massa, e se é santa a raiz, também o são os ramos (11:13-16).

Se, porém quebrando-se alguns desses ramos, tu, oliveira brava, foste enxertada neles e participaste de raiz e da seiva da oliveira, não te vanglories contra os ramos quebrados. Se, contudo, te vangloriares, sabes que não és tu que sustentas a raiz, mas a raiz é que te sustenta. Objetarás, porém: "Quebraram-se os ramos, para que eu fosse enxertada." Bem, por causa da sua incredulidade foram quebrados; tu, graças à tua fé, estás firme. Não te ensoberbeças, pois; mas enche-te de temor. Porque, se Deus não poupou os ramos naturais, tampouco há de poupar-te (11:17-21).

Considera, por isso, a bondade e severidade de Deus, severidade para com aqueles que caíram e bondade de Deus para contigo, suposto que continues a firmar pé nessa bondade; do contrário serás cortado também. Quanto a eles, se não permanecerem na incredulidade, serão reenxertados; pois Deus é poderoso para enxertá-los novamente. Pois se foste cortado de uma oliveira brava por natureza, e contra a natureza foste enxertado em boa oliveira, quanto mais facilmente serão reenxertados na sua própria oliveira esses que são ramos naturais.

 

O apóstolo prevê, que chegará o dia em que muitos hebreus se voltarão ao Cristo e daí, os que renasceram espiritualmente, Deus enxertará novamente à uma oliveira nobre, à qual pertenceram os seus antepassados justos. Como comprovação disto, o apóstolo Paulo cita as profecias do profeta Isaías. Infelizmente, as circunstâncias e os detalhes das futuras mudanças históricas são obscuras para nós. Provavelmente, esta volta ao Cristo acontecerá um pouco antes da Segunda Vinda de Cristo. Daí os judeus que acreditarão como que completarão o número, que ficou incompleto com a apostasia de outros. Na sua Epístola aos Tessalonicenses o apóstolo prevê a apostasia em massa de vários povos (2 Tessalonicenses 2:3).

 

Com efeito, não quero, irmãos, que ignoreis mistério para não presumirdes aos vossos olhos de sábios: a cegueira abateu-se sobre uma parte de Israel, até ao tempo em que o número completo dos gentios tiver ingressado no Reino de Deus. E então Israel em peso será salvo, como está escrito: "De Sião virá o Salvador e desterrará a impiedade de Jacó." "É esta a aliança que com eles faço, quando Eu tirar os seus pecados" (Isaías 59:20-21 e 27:9). Quanto ao Evangelho, sim, são inimigos de Deus, para proveito vosso; mas, quanto à eleição Divina, são eles mui amados, por causa dos patriarcas. Porque, os dons de Deus e a vocação Divina são irrevogáveis. Do mesmo modo que vós éreis rebeldes a Deus e agora encontrastes misericórdia, em conseqüência da rebeldia deles, assim, por sua vez, eles agora se rebelaram, em conseqüência da misericórdia que vos coube, para também eles encontrarem misericórdia. Deus, com efeito, os fez cair em rebeldia; envolveu todos na desobediência a fim de usar misericórdia para com todos (11:25-32).

 

Aqui as palavras "Israel em peso será salvo" se referem aos autênticos filhos de Abraão, isto é, àqueles judeus, que herdaram do Abraão as suas qualidades espirituais. As palavras: "De Sião (ou como diz o texto em hebraico para o Sião) virá o salvador" não são claras. Alguns acham, que a palavra "salvador" se refere ao profeta Elias, que deve vir antes da Segunda Vinda de Cristo para "restabelecer tudo" (Mateus 17;11).

O apóstolo nota a grande sabedoria de Deus nestes acontecimentos mundiais — a apostasia de Israel e a conversão dos gentios, e depois a volta dos judeus à fé — pois Deus, por caminhos inconcebíveis, leva à salvação todos aqueles que serão aptos a se salvar.

 

Ó profundidade das riquezas, e da sabedoria e da ciência de Deus! Quão insondáveis são os Seus juízos e imperscrutáveis os seus caminhos! "Quem conheceu a mente do Senhor, ou, quem foi Seu conselheiro? Ou quem, par ser recompensado, primeiro Lhe deu alguma coisa?" (Isaías 40;13-14). Dele, em verdade, e por Ele, e para Ele são todas as coisas. A Ele seja dada glória eternamente. Amém! (Romanos 11:33-36).

 

Nota 4. O problema de Israel consiste no problema de pessoas com o dom espiritual. Os dons e os talentos são forças espirituais, que necessitam de um correto direcionamento. Como exemplo, vejamos o automóvel com um motor possante, mas sem o volante: isto seria uma coisa perigosíssima. Quando o homem direciona a sua energia interna à Deus, ele é capaz de um grande bem e se elevar à uma grande altura espiritual. Mas, quando ele volta as costas à Deus, ele cai sob a influência do anjo caído — um espírito, que é mais forte que ele. O diabo era outrora muito talentoso, mas caiu para o abismo do mal porque queria ficar acima de Deus. Desde o momento de sua queda ele emprega todas as suas forças para atrair outros para o seu caminho de rebeldia contra Deus. Ele tenta os homens com o mesmo meio, pelo qual ele mesmo caiu — o orgulho. Ele sabe, que pessoas mais talentosas têm mais causas para se submeter à ele.

Nem todos os pseudo-profetas dos tempos bíblicos eram charlatões, pelo contrário, muitos dentre deles eram pessoas altamente talentosas, que seguiram o caminho errado. Por exemplo, o profeta Balaão se deixou seduzir para tirar proveito material do seu Dom de profecias (Números cap. 22-24). Da mesma forma não foi atoa que o Judas Iscariota foi admitido entre os apóstolos. Ele fazia milagres junto com os outros apóstolos e expulsava o demônio, porém, num determinado momento destas atividades apostólicas decaiu da fé viva, e aí o diabo tomou conta da sua alma.

Também com o povo russo aconteceu uma tragédia de perversidade, parecida com a de Judas, um povo que não sem fundamento era chamado de povo teóforo. Quando ele esfriou para com a sua fé, nos anos de revolução ele começou desesperada e obstinadamente perseguir tudo aquilo, que outrora ele venerava. A sua espiritualidade natural virou uma anti-espiritualidade, a sua humildade — orgulho, e a sua misericórdia — ódio. Assim o diabo se vingou por todas as derrotas outrora sofridas que os santos russos lhe desferiram. Parece, que neste plano podemos também compreender toda a tragédia do povo eleito de Israel. Este povo, renegando a fé viva, se sujeitou à influencia do rei das trevas e se voltou contra Deus. Assim, todo o homem espiritual, que não serve à Deus com todo o seu coração, está numa situação muito perigosa, pois pode sofrer a influência maligna do diabo. Isto na língua da igreja se chama "prelest" — sedução. Os pseudo-profetas, os pseudo-anciões, os pseudo-bispos — todos eles são pessoas muito talentosas espiritualmente, e por isso, muito perigosos — quanto mais talentosos — mais perigosos eles são.

A apostasia de Israel é uma tragédia, não só de um povo, mas de toda a humanidade. Porém devemos nos alegrar que esta não é a última palavra na história da humanidade e que, ao que parece, já começou a sua volta ao Cristo.

Nota 5. Nós vivemos numa época importante, quando a volta ao Cristo do povo hebreu, prevista pelo apóstolo Paulo, começou a se efetivar. O ponto de partida deste momento de cristianização foi o advogado judeu, José Rabbinovich, da cidade de Kishinev (Bessarábia), no século XIX. Ele visitou a Terra Santa para ajudar a converter os judeus ao cristianismo, e para tanto começou a estudar o Novo Testamento, procurando lá os lugares onde há menção sobre o Israel antigo. Este estudo dos Evangelhos e das Epístolas o levou à convicção de que Jesus Cristo é aquele Messias prometido pelos profetas, mas Que não foi reconhecido pelos antepassados. Ao retornar para a Bessarábia, ele começou a pregar Cristo, oralmente e por escrito a todos os seus compatriotas. O seu trabalho foi coroado por êxito e alguns anos mais tarde na Bessarábia surgiu a Sociedade de Hebreus Messiânicos, que se estendia da Áustria até a Sibéria. Assim, no final do século XIX o número de judeus batizados estava aumentando na Europa Oriental e Média.

Ainda no ano de 1866 surgiu a Associação Hebréia Cristã da Grã-Bretanha — quase que ao mesmo tempo com o movimento sionista. A Associação Hebréia Cristã Americana surgiu no ano de 1915, e a Organização Mundial Hebréia Cristã foi fundada em 1925. Quase ao mesmo tempo surgiram várias comunidades hebréias cristãs na Europa, nos Estados Unidos e a primeira sinagoga Messiânica na Bessarábia. Ao final dos anos de 1970 o número de comunidades hebréias cristãs nos Estados Unidos chegou a trinta. Em meados dos anos 1980 o seu número cresceu a cem. No começo dos anos 1990 o seu número chegou a cento e cinqüenta. Estão constantemente surgindo novas comunidades em várias partes do mundo.

Algumas comunidades surgiram como resultado do empenho particular missionário de já existentes comunidades cristãs protestantes, porém a grande maioria surgiu completamente independente no meio dos judeus ortodoxos, que estudam a Bíblia. E apesar de que há umas certas divergências entre estas comunidades, todas elas convergem para a fé em Jesus Cristo como o prometido Messias, todos elas crêem na Santíssima Trindade, todas elas aceitam a Bíblia como um livro ditado pelo Espírito Santo, aceitam o batismo e crêem na vida após a morte.

Hoje em dia há cerca de 200 comunidades messiânicas hebréias em todo o mundo, isto é, judeus-cristãos, que mantêm os seus costumes nacionais. Nos livros de telefone elas figuram sob a rubrica "Jewish Messianic." Existem as seguintes comunidades hebréias cristãs: "Union of Messianic Jewish Congregations," "The Fellowship of Messianic Congregations" , "International Alliance of Messianic Congregations and Synagogues," "Messianic Jewish Alliance of America," "Jews for Jesus," "The Chosen People," "American Board of Mission to the Jews," e tantas outras. Os membros destas congregações, aceitando os principais dogmas cristãos, se empenham na conservação de sua nacionalidade e continuam a manter as antigas festas hebréias e os costumes, como, por exemplo, o Sábado, a circuncisão, a Páscoa e outros.

Podemos achar outras informações sobre o movimento Messiânico nos seguintes livros: Return of the Remnant, do Dr. Michael Schiffman, Lederer Publication, Baltimore, Maryland, 1992, e Messianic Jews, de John Fieldsend, Marc Olive Press, Monarch Publications 1993. Algumas destas comunidades messiânicas editam revistas e livros, onde, baseando-se nas profecias do Antigo Testamento, comprovam com todas as evidências aos seus irmãos-judeus que Nosso Senhor Jesus Cristo é aquele Messias prometido. Esta literatura pode ser obtida, por exemplo, da editora Jews for Jesus, 60 Haight St., San Francisco, CA 94102, telefone (415) 864-2600.

 

 

A Essência da Vida Cristã.

(Romanos 12:1-15:13)

Após expor as principais verdade da fé cristã, o apóstolo Paulo, na Segunda parte de sua Epístola passa a expor a moral cristã. O apóstolo quer convencer os cristãos de viver para Deus, para o bem do próximo, e aspirar o Reino dos Céus. Ele conclama os cristãos a se assemelharem ao seu Salvador na abstenção, no desinteresse, na humildade, na paciência, e em outras qualidades. Porém, a coisa principal o que um cristão deve almejar — é amar a todos, assim como Cristo nos amou.

As tentações, os obstáculos e as dúvidas são inevitáveis nesta vida temporária. Para não enfraquecer no empenho cristão, é necessário ser preparado desde o começo para a ascese. Os obstáculos podem ser tanto internos como externos. Os obstáculos internos provêm da fraqueza espiritual, do egoísmo e dos desejos pecaminosos. Os obstáculos externos são do diabo, as circunstâncias desfavoráveis e de homens. O apóstolo resume os seus ensinamentos de uma vida cristã assim:

 

Rogo-vos, pois, irmãos, pela misericórdia de Deus, que ofereçais os vossos corpos como hóstia viva, santa e agradável a Deus. Seja este o vosso culto espiritual. Não vos conformeis com este mundo, mas, transformai-vos pela renovação do espírito, para chegardes a conhecer qual seja a vontade de Deus; o que seja bom, agradável e perfeito (12:1-2).

 

Ainda no meio de sua Epístola o apóstolo convencia os cristãos de "se acharem mortos para o pecado, porém vivos para Deus" e " com o espírito mortificar as obras da carne" — i.e., não se deixar influenciar por desejos pecaminosos. Agora ele repete isto por outras palavras e pede que eles "ofereçam os seus corpos como hóstia viva, santa e agradável a Deus." Com estas palavras o apóstolo quer explicar, que a fé cristã inclui obrigatoriamente uma ascese ativa de abstinência, uma vida pura e casta, desinteresse, perseverança em orações, o cumprimento de suas obrigações familiares e sociais, e uma manifestação ativa do amor ao próximo. Junto com isto, o apóstolo aconselha ser atencioso para que esta nossa ascese ou serviço a Deus seja racional, i.e., que ela correspondesse à Sua vontade, porque um zelo cego e inoportuno pode trazer mais dano que proveito.

A congregação cristão romana daqueles tempos, assim como a maioria de congregações cristãs em outras cidades não era coesa. Ela consistia de pessoas de diversas origens de nacionalidade, e também de diversos níveis culturais. É natural, que uma pessoa batizada quando já adulta, preserva até um certo ponto os seus pontos de vista anteriores, e não se pôde libertar tão rapidamente de seus costumes e hábitos. Muitas vezes aquilo que foi herdado de um dado meio como uma "bagagem" intelectual é estranho ao ensinamento cristão e precisa ser purificado e corrigido. É por isso, que o apóstolo quer convencer os cristãos se renovar pelo pensamento — se libertar dos antigos pontos de vista, de preconceitos judeus e pagãos e assimilar o ponto de vista puro, cristão, - em outras palavras, receber "o pensamento de Cristo" (1 Coríntios, 2:16). O apóstolo diz, que quanto mais um cristão progride nesta renovação interior, tanto mais ele fica suscetível àquilo que Deus lhe inspira e desta maneira se transforma num condutor da santa vontade de Deus.

Como veremos mais adiante, nas suas recomendações para uma vida cristã o apóstolo Paulo volta várias vezes ao tema de amor, explicando as suas propriedades e suas manifestações. Conforme o apóstolo, os nossos atos recebem o seu valor exatamente conforme o grau de nosso amor para com os outros. Sem amor, mesmo a maior ascese não significa nada. (Mais detalhes — veja no 1 Coríntios, cap. 13).

 

O uso dos dons espirituais.

(12:1-21)

Se amor é a maior virtude, a humildade é a base de todas as virtudes. A humildade é um humilde conceito de si mesmo: reconhecimento de sua própria fraqueza espiritual, a desconfiança acerca de suas próprias virtudes, ligada à esperança da ajuda de Deus e à disposição de se submeter sempre à Sua santa vontade. Assim como o orgulho mata tudo que é bom no homem, assim a humildade ajuda ao seu crescimento espiritual. Foi por isso que Nosso Senhor Jesus Cristo cita a primeira bem-aventurança como pobreza espiritual, isto é, humildade. Quanto mais fundo for o fundamento, tanto mais alto prédio pode ser levantado nele, e quanto maior humildade, tanto mais alto espiritualmente pode se levantar um homem. Por isso o apóstolo Paulo começa os seus ensinamentos sobre uma vida cristão a partir da humildade:

 

Em virtude da graça que me foi dada, exorto a cada um de vós que não presuma mais de si do que convém, mas sinta de si com modéstia, conforme a medida da fé que Deus repartiu a cada um. Porque, como em só um corpo temos muitos membros, sem exercerem todos os membros a mesma função, do mesmo modo, embora muitos, somos um só corpo, sendo todos membros uns dos outros. Temos carismas diversos, conforme a graça eu nos foi dada. Quem tiver o dom da profecia, use-o em harmonia com a fé. Quem tem o dom do ensino, dedique-se ao ministério. Quem tem o dom da pregação, pregue. Quem distribui esmola, distribua-a com liberalidade; se é superior, seja-se superior com solicitude; exercendo misericórdia, exerça-se com alegria. (12:3-8).

 

Aqui temos dois pensamentos importantes. O primeiro diz, que a cada fiel Deus dá um determinado talento; o segundo — que o talento recebido precisa ser usado para proveito de todos. Na sua Epístola aos Coríntios (1 Cor. cap. 12), o apóstolo Paulo explica este tema com mais detalhes. Lá, assim como aqui, ele compara a Igreja de Cristo com o corpo, onde cada membro tem sua própria designação. Assim como no corpo não há membros desnecessários e um membro completa o outro, assim também deve ser na Igreja de Cristo — cada fiel é chamado para servir ao bem da comunidade.

Apesar de que cada fiel recebe seu próprio talento espiritual de acordo com o seu trabalho na Igreja, assim todos, sem exceção receberam um grande dom, comum a todos — o amor. Estas são as propriedades e os sinais deste dom celestial:

 

Seja vossa caridade sem fingimento. Odiai o mal e abraçai o bem.

Amai-vos uns aos outros com caridade fraterna,

Porfiai em honrar-vos uns aos outros.

Não sejais remissos no zelo.

Sede fervorosos de espírito

E servi ao Senhor.

Alegrai-vos na esperança.

Perseverai na tribulação

E sede constantes na oração.

Socorrei as necessidades dos santos.

Esmerai-vos na hospitalidade (12:9-13).

 

O apóstolo convence aos cristãos de perdoar os que ofenderam, seja quem fôr eles, porque o amor cura todas as feridas espirituais, tanto pessoais como as dos outros.

 

Abençoai os que vos perseguem e não os amaldiçoeis. Alegrai-vos com os que se alegram. Chorai com os que choram. Fomentai entre vós o espírito da concórdia. Não sejais altivos. Simpatizai-vos com os humildes; não vos presumais de sábios. Não pagueis a ninguém mal por mal. Procurai fazer o bem ante todos os homens. Vivei em paz, quanto possível, e, dependendo de vós, com todos os homens. Não façais justiça por própria conta, caríssimos, mas deixai agir a cólera de Deus, porque está escrito: "A Mim pertence a vingança. Eu farei a justiça, diz o Senhor" (Deuteronômio, 32:35). "Se teu inimigo tiver fome, dá-lhe de comer, se tiver sede, dá-lhe de beber. Se fizerdes isto acumularás brasas vivas sobre sua cabeça" (Provérbios 25:21-22). Não te deixes vencer pelo mal, mas vence o mal pelo bem (12:14-21).

 

Se acontecer algum conflito com alguém, é importante não se render aos sentimentos de ódio e vingança. Apesar de que a nossa primeira reação é sempre revidar a ofensa, e por assim dizer, "dar-lhe uma boa lição", devemos nos lembrar que o perigo principal para nós não consiste nele, mas nos nossos próprios sentimentos de ódio e vingança. Se nos deixamos estes sentimentos progredir dentro de nós, eles começarão a nos corroer por dentro e daí podemos perder todos os dons espirituais que nos foram dados por Deus. É possível vencer o inimigo exterior, porém o nosso homem interno sofrerá uma grande e grave derrota. Por isso Deus nos deu somente uma única arma contra o mal: o bem! "Não te deixes vencer pelo mal, mas vence o mal pelo bem." Esta arma é muito poderosa, apesar de que as vezes é necessário bastante tempo para receber os resultados esperados. Se o nosso inimigo continuar a lutar contra nós, então, conforme o apóstolo, o Próprio Juiz se vingará por nós.

 

A obediência das autoridades seculares.

(13:1-7)

Qualquer sociedade, seja a família, uma sociedade comercial, alguma organização ou país consistem naturalmente de mais velhos e mais moços, de chefes e subordinados, de autoridades e cidadãos. Sem esta estrutura piramidal não pode existir nenhuma sociedade. Por isso nem os profetas, nem os apóstolos nunca tentavam quebrar as estruturas sociais e condenavam anarquia e motins.

O apóstolo fala aqui sobre a obediência a autoridades seculares provavelmente porque os judeus da sua época perderam a sua independência nacional e este assunto lhes tocava muito. Sabemos, que os governantes romanos muitas vezes abusavam da sua autoridade sobre os judeus e sem justa causa feriam os seus sentimentos nacionais e religiosos. Neste grande contraste entre os ensinamentos elevados cristãos e a devassidão da classe dos governantes, é claro que houve uma pergunta comum tanto à judeus como à cristãos de todas as nacionalidades: será que não é uma traição a Deus acatar aqueles, que não aceitam a Sua autoridade e legitimam os costumes pagãos? Na sua Epístola aos Romanos o apóstolo Paulo explica, que o próprio princípio de autoridade foi estabelecido por Deus e por isso é preciso acatar os governantes seculares mesmo se infiéis.

 

Estejam todos sujeitos ao poder da autoridade, porque não existe autoridade que não venha de Deus, e as que existem foram instituídas por Deus. Por isso, quem se opõe à autoridade, opõe-se à ordem de Deus, e os que se opõem, atraem sobre si mesmos a condenação. Os magistrados não são motivo de temor aos que fazem o bem, mas aos que praticam o mal. Queres viver sem temer a autoridade? Pratica o bem e merecerás sua aprovação. Pois, ela colabora com Deus para o teu bem. Se, porém, praticares o mal, teme, porque não é debalde que ela traz a espada; ela colabora com Deus para infligir o castigo ao malfeitor. Pelo que é necessário sujeitar-se a ela, não só pelo temor do castigo, mas também por obrigação em consciência. Por esta razão é que também pagas tributos, pois os magistrados, enquanto atendem com zelo a esse seu ofício, são ministros de Deus. Daí a todos o que lhes é devido; tributo a quem compete tributo; imposto a quem compete imposto; temor a quem compete temor, honra a quem compete honra (13:1-7).

 

Um conselho parecido podemos também achar na Epístola do apóstolo Pedro: "Sujeitai-vos a qualquer instituição humana por amor ao Senhor. Ao rei, porque é soberano, aos governadores, porque são seus delegados, cuja missão é punir os malfeitores e enaltecer os bons. Esta é a vontade de Deus: fazer calar, pela prática do bem, a ignorância dos homens insensatos" (1 Pedro 2:13-15). Naturalmente, aquilo que os apóstolos escrevem aqui, é antes o ideal de uma autoridade secular, do que seu emprego na prática. Porém, é sabido que todas as legislações, tanto antigas como subsequentes, tentam basear-se nos princípios da igualdade, justiça e necessidade de se preocupar com o bem dos cidadãos. Infelizmente, isto muitas vezes é melhor expresso em princípios gerais, do que nas leis usados na prática. Porém, a legislação romana na época do apóstolo Paulo era a mais perfeita de todas até então existentes. O problema não era tanto as leis, como nos próprios governadores, os quais abusavam do seu poder, violavam as leis e colocavam o bem próprio acima de tudo.

No tempo, em que o apóstolo Paulo escrevia esta sua Epístola, o imperador romano era Nero, o qual, alguns anos mais tarde, começou uma das mais ferozes perseguições dos cristãos. Como resultado desta perseguição, em Roma e nos seus arredores foram martirizados milhares de fieis e entre eles, também os apóstolos Pedro e Paulo. É difícil ver num imperador tão sanguinário e feroz como Nero o justo servo de Deus, que incentiva os bons e castiga os maus. Mas, mesmo assim, de acordo com o ensinamento cristão, em todos os casos neutros espiritualmente, nos devemos nos submeter aos nossos superiores legais, mesmo aqueles, que são hostis ao cristianismo. Devemos nos lembrar, que o Nosso Senhor Jesus Cristo e Seus apóstolos o ensinavam não só com palavras, como também com o seu próprio exemplo. Quando Poncio Pilatos se gabou, que ele tem o poder de O crucificar ou soltar, Jesus respondeu com humildade: "Não terias poder nenhum sobre Mim, se não te fosse dado do Alto." — isso significa, que em dado momento Deus te permitiu decidir sobre o Meu destino (João 19:10-11), e logo acrescentou: Saiba que "quem Me entregou a ti, tem pecado maior." Os chefes judeus são mais culpado que tu, porque fazem o mal conscientemente. Porém, tú também responderás perante Deus, porque ultrapassasses os limites do poder que ti é dado.

Para não ficarmos preocupados com a necessidade de se submeter ao poder secular, devemos nos lembrar que somos cidadãos do Rei Celestial. Aqui nós somos forasteiros temporários, porém lá seremos cidadãos eternos. Este pensamento faz compreensível as seguintes palavras do apóstolo: "Antes de tudo, exorto a que se façam pedidos, orações, súplicas e ações de graças por todos os homens, pelos reis e todos os que exercem autoridade, a fim de que possamos levar vida calma e tranqüila, com toda a piedade e honestidade" (1 Timóteo, 2:1-2; Tito 3:1). Isto que dizer: uma coisa é importante, isto é, se aproximar ao fim de nossa vida sem perturbações. Por isso, vamos pedir a Deus que ensine aos governadores manter na sociedade a necessária ordem e legalidade.

A desobediência é permitida ao cristão somente no caso de um conflito religioso, isto é, quando as exigências do poder estatal contradizem os ensinamentos cristãos. Assim, por exemplo, quando os membros do sinédrio exigiram dos apóstolos que eles deixassem de pregar o Evangelho do Nosso Senhor, o apóstolo Pedro lhes disse: "É preciso obedecer mais a Deus do que aos homens" (Atos 5:29). Nos casos de um conflito religioso o cristão deve permanecer fiel a Deus até a morte, como Nosso Senhor nos ensinou: "Não temais aqueles que matam o corpo, e não podem matar a alma. Temei, isto sim, Aquele que pode condenar ao inferno alma e corpo" (Mateus 10:28). Assim, a regra geral é: "daí a Deus o que é de Deus e a César o que é de César" (Marcos 12:17).

O apóstolo termina este ensinamento com o apelo de respeitar todo homem — de acordo com a sua posição e idade, e também respeitar as leis existentes e a ordem social.

 

O amor é a coisa principal.

(13:8-14).

 

A ninguém fiqueis devendo coisa alguma, senão a caridade mútua; pois, quem ama ao próximo, cumpriu a Lei. Com efeito, os mandamentos: não cometerás adultério; não matarás; não furtarás; não cobiçarás, e qualquer outro mandamento vem a resumir-se nesta sentença: "Amarás a teu próximo como a ti mesmo" (Leviticus, 19;:18). A caridade não pratica o mal contra o próximo. Logo, a caridade é o pleno cumprimento da Lei. (13:8-10).

 

Ainda o Nosso Senhor Jesus Cristo explicou aos escribas judeus, que toda a lei e os profetas têm como fundamento estes dois mandamentos de amor a Deus e amor ao próximo (Mateus 22:40). Por outras palavras, todo o ensinamento das Escrituras Sagradas converge para o amor a Deus e ao próximo. Quem ama, cumpriu todos os mandamentos da Lei de Deus; e ao contrário, quem faz algo sem o sentimento de amor, trabalha em vão.

Mais adiante, o apóstolo lembra aos cristãos que eles saíram do mundo da escuridão e entraram para o mundo da luz. Por isso, também toda a vida deles deve refletir os sublimes ensinamentos cristãos (Mateus 5:14-16), para que as preocupações com as necessidades não se transformarem em excessos de perversão pecaminosa.

 

Tanto mais que conheceis qual o tempo em que estamos: já é chegada a hora de vos erguerdes do sono; nossa salvação está agora mais perto do que quando abraçamos a fé. A noite vai avançada e o dia vem chegando. Despojemo-nos, pois, das obras das trevas e revistamo-nos das armas da luz. Vivamos honestamente, como em pleno dia, não em glutonerias e bebedeiras, não em mancebias e licenciosidades, não em contendas e inveja. Mas, revistamo-nos do Senhor Jesus Cristo e não regaleis a carne para excitar os apetites desordenados. (13:11-14).

Um pouco antes, o apóstolo disse, que no batismo o homem ressuscitou junto com Cristo, e agora ele persuade os batizados vestir Cristo, isto é, se assemelhar a Ele por suas qualidades espirituais. Na sua Epístola, o apóstolo fala principalmente sobre aquelas qualidades que são mais necessárias na comunidade cristã: perdão, não condenação, harmonia mutua, condescendência para com as fraquezas dos outros e preocupação com a salvação dos seus próximos.

 

A vida em harmonia.

(14:1-23)

A comunidade cristã em Roma era uma grande mistura étnica e social. Por exemplo, os judeus faziam muita questão de diferenciar a comida pura ("kosher") da comida impura. Eles se agarravam nas antigas tradições judias e guardavam as festas bíblicas. Alguns deles jejuavam certos dias da semana. Porém os cristãos, que provinham dos gentios, eram mais liberais. Alguns deles, como por exemplo os ex-pitagoristas eram vegetarianos e não tomavam vinho; os ex-estóicos mantinhas as suas próprias regras dietéticas.

Com o cristianismo os fieis eram livres do cumprimento cego de várias regras dietéticas e vários costumes. Ele ensinava, que em princípio, toda comida é pura, porque foi criada por Deus e ainda é santificada por oração ( Colossenses 2:21; 1 Coríntios 10:23-33). Ao assimilar o princípio da liberdade das convenções humanas, alguns cristãos eram propensos a ligeiramente desprezar aqueles, que continuavam apegados aos costumes antigos. Porém, os apegados aos costumes antigos (que o apóstolo chama de fracos na fé) reprovavam aqueles que não cumpriam tais regras, achando-lhes reformadores, que desprezam tudo que é sagrado.

O apóstolo exorta todos os cristão a viverem em paz entre si e não brigar por causa de coisas sem importância. Na realidade, não é tão importante, o que o homem come ou que costumes guarda, mas o importante é por que ele o faz. Se aquilo que ele faz não faz mal a ninguém, ele pode continuar a faze-lo.

As vezes atras dos atos mais belos podem se esconder estímulos impuros, e pelo contrário, as vezes coisas vãs ou fúteis podem exprimir o desejo mais puro de fazer algo de bom. E Deus aceita as nossas obras não só pelo seu proveito objetivo, mas, e principalmente, pela nossa intenção. Portanto:

 

Acolhei quem é fraco na fé, sem discutir sobre suas opiniões. Esse julga poder comer de tudo; aquele, que é fraco, somente se alimenta de legumes. Quem come de tudo não despreze a quem deixa de comer. E quem não come de tudo não julgue a quem come, porque Deus o acolheu. Quem és tu para julgar um servo alheio? Se ele está de pé ou cai, isto é da alçada de seu mestre. Se ficar de pé, é porque o Senhor tem poder de o sustentar (14:1-4).

Este faz diferença entre dia e dia, enquanto aquele considera iguais todos os dias. Siga cada qual a sua convicção pessoal. Quem guarda um dia, guarda-o em honra do Senhor. E quem come de tudo, fá-lo em honra do Senhor, dando graças a Deus. Quem se abstém de comer de tudo, abstém-se em honra do Senhor, agradecendo também a Deus. Pois nenhum de nós vive para si mesmo, como nenhum de nós morre para si mesmo. Porque, vivendo, vivemos para o Senhor, e morrendo, morremos para o Senhor. Tanto na vida como na morte, pertencemos ao Senhor. Porque se Cristo morreu e ressuscitou, foi para reinar sobre os mortos como sobre os vivos,

E tu, porque julgas teu irmão, ou por que desprezas teu irmão, se todos havemos de comparecer ante o tribunal de Deus? Pois está escrito: "Por Minha vida, diz o Senhor, que diante de Mim se dobrará todo o joelho e toda a língua louvará a Deus" (Isaías 45:23; Rom. 14:5-11).

Por conseguinte, cada um de nós dará conta a Deus de si mesmo. Deixemos, pois, de nos julgar uns aos outros. Cuidai, antes, do seguinte: de não ofenderdes ou escandalizardes vosso irmão. Sei, e estou persuadido em o Senhor Jesus, que nada é impuro em si mesmo; é impuro aos olhos de que o tem por impuro.

Se por causa do que comes, teu irmão se entristece, já não procedes conforme a caridade. Não deites a perder com o teu manjar a alguém pelo qual Cristo morreu. Não seja vosso privilégio ocasião para a maledicência. Com efeito, o Reino de Deus não consiste em comida e bebida, mas na justiça, paz e alegria no Espírito Santo. E quem assim serve a Cristo, é agradável a Deus e estimado dos homens. Visemos, portanto, aquilo que promove a paz e a edificação mútua. Não destruas, por amor de uma comida, a obra de Deus. Todas as coisas são, na verdade, puras; mas o que é mau para alguém é causa de escândalo pelo que come. É louvável não comer carne, nem tomar vinho, nem outra coisa com a qual se escandaliza teu irmão. A convicção que tens, guarda-a só contigo e aos olhos de Deus. Feliz de quem não tem remorso daquilo que considera justo.

Quem, pelo contrário, tem dúvidas e apesar disso come, incorre em condenação, porque não age de boa fé. Tudo quanto não procede de boa fé é pecado (14:12-23).

 

É preciso se empenhar, que todos os nossos atos não só estejam objetivamente corretos, mas que não tragam nenhum mal a ninguém. O apóstolo Paulo explica com mais clareza esta regra diretriz na sua Epístola aos Coríntios (1 Cor. 10:23-33). Alguns cristãos em Corinto compreenderam, que os ídolos não são nada e por isso achavam que os sacrifícios pagãos eram uma simples e inofensiva superstição do povo sem instrução. Alguns destes sabichões até visitavam tais templos e comiam a comida do sacrifício. Esta sua conduta perturbava — e muito — alguns dos neófitos mais fracos, que achavam que isto representava a traição da fé cristã e um aberto reconhecimento dos deuses pagãos. O apóstolo explica aos Coríntios, que o problema não consiste na comida em si, quando esta é comida com oração, mas na tentação resultante de tal conduta. A regra geral deve ser esta: "Portanto, quer comais, quer bebais, ou façais alguma outra coisa, fazei tudo para a glória de Deus. Portai-vos de modo a não dar escândalo, nem aos judeus, nem aos gregos, nem à Igreja de Deus, como também eu procuro agradar a todos em tudo, não buscando o meu interesse, mas o de todos, para que sejam salvos" (Coríntios 10:31-33).

 

Cristo é o exemplo de paciência infinita.

(15:1-13).

Terminando os seus ensinamento, o apóstolo Paulo conclama os cristãos espiritualmente adultos ("fortes na fé") a ter paciência e compreensão para com os irmãos fracos na fé. Como exemplo de uma paciência infinita, ele cita o Cristo:

 

Ora, nos que somos mais fortes, devemos suportar as fraquezas dos fracos e não buscar a nossa própria satisfação. Cada um de nós procure agradar ao próximo, em prol do bem para edificação; porque também Cristo não procurou a própria satisfação, mas como está escrito: "Caíram sobre Mim as injúrias dos que Te ultrajavam" (Salmo 28:10). Com efeito, tudo quanto foi escrito, foi-o para o nosso ensinamento, a fim de que, pela paciência e consolação que nos sugerem as Escrituras, nos confirmemos na esperança. Que o Deus da paciência e da consolação vos inspire sentimentos de harmonia, a exemplo de Cristo Jesus. Para que, com um só coração e uma só boca glorifiqueis a Deus, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo (15:1-6).

 

Aqui o apóstolo cita um trecho do salmo 68, onde são profetizadas as humilhações e os sofrimentos de Messias. Cumpriu-se a profecia deste salmo, versículo 10, que diz: "Pois o zelo de Tua Casa consumiu-me e as calúnias de Teus insultadores caíram sobre mim," quando Nosso Senhor Jesus Cristo, ainda no começo da Sua missão, visitou Jerusalém. Quando Ele viu que no templo havia um ativo comércio, o espírito Dele ficou indignado. Ele fez um açoite de barbantes e expulsou todos os vendedores e cambistas do templo, dizendo: "Minha Casa será chamada Casa de Orações. Vós, porém, a transformastes em covil de ladrões!" (Mateus 21:13). Como com isto Jesus estrangulou os interesses materiais tanto dos comerciantes, como dos chefes judaicos, todos se viraram contra Ele e O humilharam aos olhos do povo.

A partir de então os chefes judeus começaram a odiar Cristo e não deixaram de escapar a oportunidade de humilhar a Sua autoridade perante o povo. Eles se lembraram deste caso durante o julgamento de Caifás. Assim, ao defender a santidade do templo, Jesus Se submeteu a Si mesmo à humilhação daqueles, que estavam profanando o templo desonrando Aquele, a Quem o templo pertencia. O apóstolo Paulo demonstra este caso como um exemplo, para que os cristãos, imitando o seu Salvador, não fugissem de humilhação e sofrimentos, quando isto se torna necessário para defender a glória de Deus e quando isto traz um proveito espiritual aos outros.

Na sua Epístola o apóstolo Paulo muitas vezes se volta para o exemplo do Salvador, Que por misericórdia a nós se privou da Sua glória celestial e desceu até o nosso mundo afligido pelo mal. Os judeus tinham direito de se acharem cidadãos do vindouro Reino de Messias. Mas o apóstolo, provando que os judeus são tão pecadores quanto os gentios, agora explica, que Deus estende a Sua graça a todos os povos, não excluindo ninguém do Seu Reino. Para comprovar esta mais importante verdade do Novo Testamento, o apóstolo dá os testemunhos dos antigos profetas.

 

Por isso, socorram-se uns aos outros, como Cristo vos socorreu para a glória de Deus. Afirmo, pois, que Cristo se fez ministro dos circuncisos como prova da veracidade de Deus, para cumprir as promessas feitas aos antepassados, ao passo que os gentios glorificam a Deus pela misericórdia que usou com eles, como está escrito: "Pelo que Te glorificarei entre os gentios e cantarei louvores ao Teu Nome" (Salmo 17:50). Também em outra passagem: "Alegrai-vos com seu povo, ó gentios!" (Deuteronômio 32:43). Ainda: "Louvai ao Senhor, gentios todos; glorifiquem-No todos os povos" (Salmo 116:1). Diz também Isaías: "Brotará a raiz de Jessé e seu rebento dominará sobre os gentios. Nele os gentios porão a sua esperança" (Isaías 11:10). Que o Deus da esperança vos encha de toda a alegria e de paz na fé, para que se corrobore mais e mais a vossa esperança, pelo poder do Espírito Santo (15:7-13).

 

Nota: Jessé era pai do rei Davi. A expressão "a Raiz de Jessé" significa Messias.

 

Os Votos e as Saudações.

(15:14-16-24)

O apóstolo termina a sua Epístola com alguns pensamentos complementares e saudações. Esta parte é clara e não precisa de explicação.

 

Por mim, estou persuadido a vosso respeito, irmãos meus, de que vós mesmos estais cheios de boa vontade, repletos de todo o conhecimento, capazes também de vos admoestardes uns aos outros. Sem embargo, escrevi-vos com toda a franqueza para avivar vossa memória, em vista da graça que me foi dada por Deus, de ser ministro de Jesus Cristo entre os gentios, realizando o sagrado serviço do Evangelho de Deus, para que os pagãos se tornem uma oferenda agradável, santificada no Espírito Santo. Posso, portanto, gloriar-me em Cristo pelo que respeita o serviço de Deus.

Com efeito, não ousarei falar de êxito algum senão do que Cristo fez por mim na conversão dos gentios, pela palavra e ação, pelo poder dos milagres e prodígios, pela virtude do Espírito de Deus, chegando eu a divulgar em todos os cantos o Evangelho de Cristo, desde Jerusalém e regiões circunvizinhas até a Ilíria. Timbrei, entretanto, em não anunciar o Evangelho, onde o nome de Cristo já era conhecido, por não querer edificar sobre fundamento alheio; mas procedi como está escrito: "Vê-Lo-ão aqueles a quem Ele não foi anunciado e conhecê-Lo-ão os que Dele não ouviram falar" (Romanos 15:14-21;Isaías 52:15).

Por esta razão é que tantas vezes me via impedido de visitar-vos. Agora, porém, como já não tenho campo de trabalho nestas regiões, e desde longos anos desejo visitar-vos, irei ter convosco, quando fôr à Espanha, pois nutro as esperança de ver-vos, ao passar de viagem aí e de ser por vós encaminhado para lá, depois de ter gozado um pouco de vossa companhia. Agora, entrementes, sigo para Jerusalém, a serviço dos santos: porque a Macedonia e a Acaia tiveram por bem fazer uma coleta em favor dos pobres que há entre os santos de Jerusalém. Sim, elas tiveram por bem porque lhes são devedoras: se os pagãos, com efeito, participaram de seus bens espirituais, eles devem, por sua vez, assistir-lhes com seus bens temporais. Quando tiver cumprido este encargo e entregar oficialmente essa oferta, encaminhar-me-ei para a Espanha, visitando-vos. Estou seguro de que, indo ter convosco, vos levarei a plenitude das bençãos de Cristo (15:22-29).

 

Logo desde o primeiro ano de cristianismo Jerusalém virou o centro de judaísmo militante, onde de tempos em tempos os cristãos eram submetidos às ferozes perseguições (Atos 8:1). Valendo-se da ilegalidade dos cristãos, os judeus mais agressivos desfalcavam impunemente os seus bens (Hebreus 10:34), e como resultado disto, a igreja de Jerusalém era paupérrima, e precisava de auxílio. O apóstolo Paulo, pregando em vários lugares, nunca se esquecia da sua Igreja-mãe e de tempos em tempos colhia auxílio monetário para ela (1 Coríntios 16:1-4; 2 Coríntios, capítulos 8-9). Aqui o apóstolo Paulo se refere a um destes auxílios, que ele pretendia levar pessoalmente para Jerusalém.

O apóstolo prevê que durante a sua visita a Jerusalém, ele poderia ser perseguido e ele não se enganou. Como sabemos do livro dos Atos (Atos 22:22-24:1) uma multidão ensandecida formada pelos fanáticos por pouco que não matou o apóstolo durante a sua visita a Jerusalém. Depois disto ele foi preso e ia ser julgado em Cesaréia. Porém o apóstolo, sendo cidadão romano, exigiu o julgamento do imperador romano. Assim, após muitas peripécias o apóstolo Paulo afinal chegou até Roma. Mas aqui nós nos antecipamos. O apóstolo escreve:

 

Rogo-vos, porém irmãos, por Nosso Senhor Jesus Cristo e pelo amor do Espírito, me assistais na luta com as vossas orações que dirigis a Deus por mim, para ser salvo das mãos dos infiéis da Judéia, e ter boa acolhida por parte dos santos o serviço que me leva a Jerusalém. Então, passarei a ver-vos com satisfação, se Deus fôr servido, e poderei restaurar em vosso meio as minhas forças. O Deus da paz esteja convosco! Amém. (15:30-33).

 

 

Devemos Guardar a Pureza da Fé.

(16:17-20)

Ainda durante a vida dos apóstolos diversos hereges começaram a deturpar a fé cristã. Para atingir melhor os seus interesses cobiçosos, os heresiarcas utilizavam a terminologia cristã e com diversas técnicas retóricas arrastavam os mas ingênuos nas suas seitas. Visando a pureza da fé, os apóstolos persuadiam os cristãos a não darem ouvidos a estes heresiarcas. Veja: Atos 20:28-31: Tiago 3:1; 2 Pedro 2:1; 1 João 4:1; 2 João 1:9-11; 2 Coríntios 11:13-15; Galatas 1:8-9; Colossenses 2:8; Filémon 3:2; 2 Tessalonicenses2:10-12:1; 1 Timóteo 1:5-7; 2 Timóteo 2:16-19; Tito 1:9-11 e 3:10; Hebreus 13:9.

O apóstolo vê o constante perigo que vem dos heresiarcas e pede aos cristãos romanos que não se deixem seduzir por sua retórica e seus sofismas, mas que insistam na fé que lhes foi pregada desde o início e na unidade da igreja. Ele escreve:

 

Rogo-vos, entretanto, irmãos, que vos acautelais dos que provocam dissensões e escândalos em contradição com a doutrina que aprendestes. Evitai-os. Porque esta gente não serve a Cristo, nosso Senhor, mas ao próprio ventre. Com belas frases e lisonjas seduzem os corações dos incautos. A vossa conversão, porém, chegou aos ouvidos de todos. Congratulo-me convosco e quero que sejais prudentes com respeito ao bem, mas singelos no que diz respeito ao mal. O Deus da paz não tardará em esmagar Satanás debaixo de vossos pés. A graça de Nosso Senhor, Jesus Cristo, esteja com todos vós! Amém! (16:17-20).

 

Em outras suas Epístolas o apóstolo Paulo escreve com ainda maior clareza contra os heresiarcas:

 

"Estai alerta, para que ninguém vos enrede e engane com filosofias, argúcias frívolas que se baseiam sobre a tradição dos homens e tratam do ‘elemento do mundo’, que nada tem a ver com Cristo" (Colossenses 2:8). "Diz claramente o Espírito que, nos últimos tempos, alguns renegarão a fé, dando crédito a espíritos sedutores e doutrinas diabólicas, seduzidos pela hipocrisia de homens mentirosos, marcados a ferro em brasa na própria consciência" (1 Timóteo 4:1-2). "Porque virá o tempo em que os homens não suportarão a sã doutrina, mas, sentindo cócegas nos ouvidos, acumularão mestres em redor de si, ao sabor de suas paixões, afastando os ouvidos da verdade e aplicando-os as fábulas."(2 Timóteo 4:3-4). "Nós mesmos, ou algum anjo do céu, que vos evangelizasse outra coisa diversa da que vos evangelizamos, maldito seja! Já o dissemos e agora repito: se alguém vos pregar Evangelho diferente do que recebestes, maldito seja!" (Galatas 1:8-9).

 

Não vamos nos aprofundar em várias heresias, porém é indispensável mencionar uma delas, que está como base de ensinamentos das modernas seitas: a saber, que o apóstolo Paulo na sua Epístola aos Romanos, enfatizando a importância da fé, rejeita a necessidade de boas obras.

Como já mencionamos, os judeus dos tempos apostólicos se recusavam a crer em Cristo porque achavam, que por sua descendência de Abraão e cumprimento cego das leis eles já eram justificados. Desmentindo os seu entendimento errôneo da justificação, construído sobre argumentos formais, o apóstolo Paulo prova que a base da justificação sempre foi a e não os externos atos da lei. Ele dá Abraão como exemplo. Do contexto da sua palestra e do exemplo de Abraão podemos ver, que o apóstolo Paulo se refere à fé viva e ativa, e não só à aceitação do messianismo de Cristo. Ele ensinava que a fé deve remodelar toda a vida de um cristão e transformá-lo de um presunçoso pecador em um homem semelhante a Cristo. Em seis capítulos da sua Epístola (7-8 e 12-15) o apóstolo explica, de que consiste a vida de um verdadeiro cristão.

Os sectários, que afirmam, que o homem se salva unicamente pela fé, independente do seu modo de viver, na realidade introduzem no cristianismo o antigo formalismo judaico, aquele, contra o qual o apóstolo Paulo lutava com tanta energia. Aquela frase alada — "crê e serás salvo" — transforma a fé num meio mágico, igual às formais ações da lei. O judeus se apegaram à um determinismo exterior, e os sectários modernos — à um determinismo intelectual. Porém, a salvação não se pode desligar da transformação interior do homem, pois esta transformação, com a ajuda da fé, se realiza durante a vida inteira. Deus quer, que o homem se transforme de um homem "velho" (cheio de amor próprio, vaidoso e corrupto) numa "nova criação" (moderado, humilde e de sacrifício). Isto quer dizer, que a meta é a transformação moral do ser humano, o que exige muito esforço, esforço para o extermínio de paixões e para um amor cristão ativo. Tanto o antigo formalismo judeu, como o formalismo moderno dos sectários é nada mais - nada menos que um tentativa de chegar ao Reino dos Céus automaticamente, sem esforços, evitando o caminho estreito de Cristo.

Porém, Cristo ensinava que o Reino dos Céus se "conquista à força" (Mateus 11:12). Justamente, porque o caminho para o Reino Celestial é estreito e cheio de espinhos, o cristão, conforme o apóstolo Paulo, precisa da ajuda onipotente do Espírito Santo (Romanos 8:11).

Não é bom, quando um cristão transgride os mandamentos por causa de uma doença ou fraqueza, mas é pior ainda quando ele deturpa o ensinamento de Cristo por causa de sua preguiça e amor próprio: quando ele escolhe nas Escrituras aquilo, que lhe é agradável e proveitoso, e renega aquilo, de que ele não gosta. Esta deturpação da verdade não tem desculpa.

Aqui nos omitimos as saudações finais do capítulo 16, porque elas não têm significado dogmático ou moralizador.

 

 

Conclusão.

Assim, o Filho de Deus Nosso Senhor Jesus Cristo encarnado é o único Salvador da humanidade, que está naufragando em pecados. O apóstolo provou, que nem a voz da consciência, nem o medo do castigo eterno, nem os magníficos ensinamentos dos profetas eram capazes de salvar o homem do seu mal principal — o pecado, o qual escraviza a sua vontade e o obriga a fazer aquilo, que na realidade ele não quer. Por isso, antes da vinda de Cristo o paraíso e a vida eterna eram inacessíveis não só aos bons pagãos, mas aos judeus, que tentavam viver conforme a lei de Moisés. A salvação do pecado e da violência do diabo veio de Cristo.

Quando Nosso Senhor Jesus Cristo desceu ao nosso mundo pecador, Ele não só ensinou ao homem a crer corretamente e viver uma vida justa, mas Ele tomou sobre Si os pecados dos homens, e com o Seu Sangue os lavou na cruz. Depois, com a Sua ressurreição ele venceu a morte e abriu a todos que Nele crêem o caminho para a vida eterna no Reino dos Céus. Agora todo homem tem acesso à clemência de Deus e à eterna salvação. E isto tudo não por causa de algum mérito pessoal, mas exclusivamente pela graça de Deus.

O ponto de partida para a fé em Cristo é o batismo. Nele o neo-batizado morre para o pecado e nasce para uma vida justa. Deus o introduz numa esfera de existência completamente nova, ainda desconhecida por ele, onde não é o formalismo da lei que age, mas a força vital de Cristo. Esta força, que é invisível para o olho, mas que é sentida por dentro ilumina a razão do fiel com pensamentos radiantes, alegra o seu coração com pensamentos puros e elevados e dá a sua vontade a inspiração para agir com amor.

Todo o contexto dos ensinamentos do apóstolo nos mostra, que a fé deve ser viva e ativa. Ela deve se mostrar continuamente na ascese de abstenção, na vida pura e casta, no desinteresse, na constância de orações, no cumprimentos de suas obrigações familiares e sociais e — principalmente — em atos de comiseração e amor. Nos seus ensinamentos, o apóstolo Paulo se volta constantemente para o exemplo do Salvador e faz tudo para convencer os cristãos de tentar imitar Cristo.

Devemos constantemente nos alegrar o agradecer Nosso Senhor Jesus Cristo por tudo, que Ele fez e faz para a nossa salvação.

 

 

 

 

Folheto Missionário no. P60

Missão Ortodoxa da Santíssima Trindade

Copyright C. 2002, Holy Trinity Ortodox Mission

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Redator: Bispo Alexandre (Mileant)

 

(Romans_p.doc. 09-15-2002)

Edited by Luzia Dimitrov